São Paulo, quarta-feira, 01 de dezembro de 2010

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O jornalista e o presidente

Editor da "New Yorker", David Remnick explora lado mais frágil de Obama em detalhada biografia que chega agora ao Brasil

LUCIANA COELHO
ENVIADA ESPECIAL A NOVA YORK

No 20º andar do prédio envidraçado da Times Square onde trabalha, David Remnick suspira e jura que não vai fazer de novo.
Há dois anos, ele inventou para si a missão de escrever a biografia do presidente Barack Obama, ao mesmo tempo em que comandava a Redação da "New Yorker", uma das revistas mais prestigiadas do país e semanal. Sem pedir licença.
O resultado de 16 meses extenuantes de trabalho é um estudo hiperdetalhado de 586 páginas (são 720 em português) sobre a vida do primeiro presidente negro dos EUA até o momento em que ele chegou ao poder, em janeiro de 2009.
Lançado em abril nos EUA e agora no Brasil, "A Ponte -Vida e Ascensão de Barack Obama" é calcado em fatos e entrevistas.
Não bastassem as complicações inerentes à biografia de um filho de uma americana branca do interior e de um estudante de intercâmbio queniano e negro no início do movimento pelos direitos civis nos EUA, criado em Seattle, no Havaí e na Indonésia, o personagem é o presidente dos Estados Unidos.
"Obama chegou ao cargo com 47 anos, tendo sido senador estadual e organizador comunitário e perdido uma eleição local. Aí, foi para o Senado [federal] americano, fez um discurso. E, quatro anos depois, virou presidente. Como? Quem é esse cara?", afirma Remnick.
Pelo texto fluido e a pesquisa exaustiva do jornalista, descobre-se um Obama humano, com pequenezas e ambições distintas da figura sebastianista da campanha e mais próxima do homem que pena para tornar real, sob tormenta, as promessas feitas a um país enlevado pela esperança que viu nele.
Na obra, há simpatia pelo democrata (Remnick diz ser de centro-esquerda e aprovar o governo), mas nenhuma condescendência com lapsos ou distorções biográficas feitas pelo próprio.
O jornalista, que vê a questão racial como tema subjacente do livro, recebeu a Folha para uma conversa sobre o presidente americano.

 

Folha - O que o surpreendeu mais durante a pesquisa?
David Remnick
- Muita, muita coisa. Sobre seus pais, a vida em Chicago. Não é que eu tenha descoberto algo enorme, mas milhares de detalhes me surpreenderam.

Você faz um retrato mais humano e menos etéreo da mãe de Obama, Ann Durham, que os da imprensa ou do filho.
É, a imagem de uma hippie de meia-idade, sonhadora. Na verdade, ela era uma mulher interessada em temas nos quais nem as pessoas na esquerda americana estavam interessadas, uma acadêmica séria e de certa forma uma feminista antes de haver o movimento feminista.

Obama parece ter herdado mais o temperamento dela que o do pai.
Eu acho. Tem um livro novo que coloca Obama como o produto do socialismo queniano do pai dele. Mas a personalidade do Obama é radicalmente diferente da do pai - alcoólatra, errático, gritalhão, carismático e fracassado. Obama está longe de ser um fracasso e longe de ser socialista. No contexto americano, ele é de centro-esqueda. Presidentes não se elegem sendo totalmente de esquerda neste país.

Democratas mais ao centro reclamam que ele forçou a barra para a esquerda com a reforma na saúde e que essa é uma das razões pelas quais ele está tendo problemas agora. O sr. não concorda?
Concordo, as pessoas têm problemas diferentes com Obama. Acho que ele conseguiu muito. Não tem opção fácil no Afeganistão e, sem pacote de estímulo econômico, as coisas estariam piores -um pacote maior não passaria. Já o avanço na saúde pode parecer pequeno, mas, para nós, é enorme.

A PONTE - VIDA E ASCENSÃO DE BARACK OBAMA

AUTOR David Remnick
TRADUÇÃO Celso Nogueira e Isa Mara Lando
EDITORA Companhia das Letras
QUANTO R$ 65 (736 págs.)


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