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16ª BIENAL DO LIVRO
O "condutor das letras" está no Brasil
Ana Carolina Fernandes - 17.dez.98/Folha Imagem
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O escritor inglês Magnus Mills finge voltar á sua antiga profissão nas ruas do Rio; ele lança "Bestas Encurraladas" na Bienal do Livro |
O inglês Magnus Mills, ex-motorista de ônibus, autografa seu "Bestas Encurraladas" na Bienal e faz palestra na Folha
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MARCELO RUBENS PAIVA
especial para a Folha
O reino onde o sol nunca se punha perde o seu poder geopolítico
e econômico, mas ainda se destaca em teatro, música e literatura.
Quase tudo de novo na cultura
contemporânea é alvoroçado pelo Reino Unido. E é de lá um dos
autores mais festejados ultimamente, Magnus Mills, 46, que vem
ao Brasil para lançar "Bestas Encurraladas", tradução brasileira
de seu romance de estréia.
Mills lança seu livro em evento
com palestra, às 19h30 de amanhã, no auditório da Folha (reservas das 14h às 17h pelo telefone 0/
xx/11/224-3473). Hoje, às 15h30, e
sexta, às 17h, estará na Bienal. Sua
vinda ao Brasil é patrocinada pela
Geração Editorial, Câmara Brasileira do Livro e Folha.
Aqueles que acompanham o
meio literário talvez se lembrem
de Mills. Ele é o tal ex-motorista
de ônibus londrino que virou escritor. Em sua estréia, Thomas
Pynchon assina a contracapa.
"Maravilha de comédia amalucada, esta rude saudação ao lado
sombrio do trabalho assalariado
tem o poder exuberante de uma
palavra mágica, que poderia ser
perigosa se falada em voz alta."
Mills foi, durante 20 anos, trabalhador braçal. Sua entrada para o
mercado literário não foi casual.
Como revela abaixo, em entrevista por telefone, de Londres, tinha
uma coluna semanal no jornal
"The Independent", sobre impressões de um motorista de ônibus londrino. Diante da repercussão de seus textos, decidiu escrever um romance. Em 98, surpreendendo o mercado, foi indicado para o mais importante prêmio de sua terra, o Booker Prize.
Agora, não dá mais para ficar
falando "ex-motorista de ônibus
publica romance". Mills ganhou a
reverência e a admiração do público e da crítica com seu estilo
original, seco, sarcástico, econômico e com o seu humor negro.
Foi traduzido em 20 países, nos
quais virou best seller. Foi xodó
das feiras de livros mais importantes por dois anos seguidos.
Além do mais, já publicou um
segundo romance, em 99, "All
Quiet on the Orient Express" (Arcade), que a Geração Editorial, a
mesma de "Bestas", promete lançar em breve como "Todos Quietos no Expresso do Oriente".
Mills trabalhou na Inglaterra, na
Escócia e na Austrália. Uma de
suas especialidades era levantar
cercas. É em torno de levantadores de cerca, um inglês e dois escoceses, que gira "Bestas".
São três personagens rudes, beberrões e vazios, que se metem
em enrascadas. Sua maior ambição é chegar aos pubs, que fecham
às 23h, a tempo para encher a cara
e fumar um cigarrinho.
Folha - O senhor ainda dirige
ônibus?
Magnus Mills - Não mais. Estou
tentando ser escritor. Inclusive,
escrevo meu terceiro romance.
Folha - O senhor sempre foi
uma trabalhador braçal. Quando decidiu mudar de ramo?
Mills - Comecei a escrever artigos semanais para o "The Independent" sobre a rotina de um
motorista de ônibus. A reação do
público foi incrível. Eu nem sabia
que escrevia bem. Mas houve um
corte de pessoal grande no jornal,
e minha coluna acabou. As pessoas diziam que eu era bom, então contatei o mercado editorial.
Folha - Estudou literatura?
Mills - Nunca. Eu me formei em
economia, em 75, e fiquei 20 anos
no trabalho braçal. Só tive contato
com a literatura na escola. Aliás,
esses cursos que ensinam a escrever não levam a nada.
Folha - Seu estilo é bem particular. Algum escritor o inspirou?
Mills - Não, tinha leitura vasta.
Por exemplo, o último livro que li,
antes de começar a escrever, foi o
de um autor italiano, Primo Levi,
sobre campo de concentração.
Folha - Como decidiu escrever
um livro sem metáforas?
Mills - Não planejei. É como sei
escrever. Não sou um poeta do século 18. E não gosto de adjetivos,
prefiro contar a história pelo diálogo, como no teatro. No mais, o
livro é uma grande metáfora.
Folha - Por que escrever sobre
escoceses que odeiam ingleses?
Mills - Morei na Escócia. Há 15
anos, vivi a realidade do livro,
construindo cercas para fazendeiros ingleses. Na verdade, os escoceses podem ter qualquer nacionalidade. Pessoas na França e na
Holanda me diziam que eles eram
iguais àqueles caras. Meu livro foi
traduzido até no Japão. Deve ter
japoneses que se reconhecem nos
personagens.
Folha - É intencional não acontecer nada no começo?
Mills - As pessoas me dizem
muito isso. A estrutura do livro é
que é importante. Ele é construído do mesmo como se constrói
uma cerca. Eu queria passar essa
experiência de levantar os postes,
esticar o arame, subir em morros,
a lama, a chuva, todo o processo.
Folha - É um livro que dá um
grande filme. O senhor recebeu
ofertas para adaptá-lo?
Mills - Sim.
Folha - De norte-americanos
ou britânicos?
Mills - Dinheiro norte-americano, com gente daqui. Mas eles
querem mudar o final, que é surpreendente. E isso está intrigando
os produtores. Eles não sabem o
que fazer. Estão perdidos.
Folha - E o senhor vai deixar?
Mills - Vou acabar deixando.
Não estou ligando muito.
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