São Paulo, terça-feira, 02 de maio de 2000


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16ª BIENAL DO LIVRO
O "condutor das letras" está no Brasil

Ana Carolina Fernandes - 17.dez.98/Folha Imagem
O escritor inglês Magnus Mills finge voltar á sua antiga profissão nas ruas do Rio; ele lança "Bestas Encurraladas" na Bienal do Livro



O inglês Magnus Mills, ex-motorista de ônibus, autografa seu "Bestas Encurraladas" na Bienal e faz palestra na Folha


MARCELO RUBENS PAIVA
especial para a Folha


O reino onde o sol nunca se punha perde o seu poder geopolítico e econômico, mas ainda se destaca em teatro, música e literatura.
Quase tudo de novo na cultura contemporânea é alvoroçado pelo Reino Unido. E é de lá um dos autores mais festejados ultimamente, Magnus Mills, 46, que vem ao Brasil para lançar "Bestas Encurraladas", tradução brasileira de seu romance de estréia.
Mills lança seu livro em evento com palestra, às 19h30 de amanhã, no auditório da Folha (reservas das 14h às 17h pelo telefone 0/ xx/11/224-3473). Hoje, às 15h30, e sexta, às 17h, estará na Bienal. Sua vinda ao Brasil é patrocinada pela Geração Editorial, Câmara Brasileira do Livro e Folha.
Aqueles que acompanham o meio literário talvez se lembrem de Mills. Ele é o tal ex-motorista de ônibus londrino que virou escritor. Em sua estréia, Thomas Pynchon assina a contracapa. "Maravilha de comédia amalucada, esta rude saudação ao lado sombrio do trabalho assalariado tem o poder exuberante de uma palavra mágica, que poderia ser perigosa se falada em voz alta."
Mills foi, durante 20 anos, trabalhador braçal. Sua entrada para o mercado literário não foi casual. Como revela abaixo, em entrevista por telefone, de Londres, tinha uma coluna semanal no jornal "The Independent", sobre impressões de um motorista de ônibus londrino. Diante da repercussão de seus textos, decidiu escrever um romance. Em 98, surpreendendo o mercado, foi indicado para o mais importante prêmio de sua terra, o Booker Prize.
Agora, não dá mais para ficar falando "ex-motorista de ônibus publica romance". Mills ganhou a reverência e a admiração do público e da crítica com seu estilo original, seco, sarcástico, econômico e com o seu humor negro. Foi traduzido em 20 países, nos quais virou best seller. Foi xodó das feiras de livros mais importantes por dois anos seguidos.
Além do mais, já publicou um segundo romance, em 99, "All Quiet on the Orient Express" (Arcade), que a Geração Editorial, a mesma de "Bestas", promete lançar em breve como "Todos Quietos no Expresso do Oriente".
Mills trabalhou na Inglaterra, na Escócia e na Austrália. Uma de suas especialidades era levantar cercas. É em torno de levantadores de cerca, um inglês e dois escoceses, que gira "Bestas".
São três personagens rudes, beberrões e vazios, que se metem em enrascadas. Sua maior ambição é chegar aos pubs, que fecham às 23h, a tempo para encher a cara e fumar um cigarrinho.

Folha - O senhor ainda dirige ônibus?
Magnus Mills -
Não mais. Estou tentando ser escritor. Inclusive, escrevo meu terceiro romance.

Folha - O senhor sempre foi uma trabalhador braçal. Quando decidiu mudar de ramo?
Mills -
Comecei a escrever artigos semanais para o "The Independent" sobre a rotina de um motorista de ônibus. A reação do público foi incrível. Eu nem sabia que escrevia bem. Mas houve um corte de pessoal grande no jornal, e minha coluna acabou. As pessoas diziam que eu era bom, então contatei o mercado editorial.

Folha - Estudou literatura?
Mills -
Nunca. Eu me formei em economia, em 75, e fiquei 20 anos no trabalho braçal. Só tive contato com a literatura na escola. Aliás, esses cursos que ensinam a escrever não levam a nada.

Folha - Seu estilo é bem particular. Algum escritor o inspirou?
Mills -
Não, tinha leitura vasta. Por exemplo, o último livro que li, antes de começar a escrever, foi o de um autor italiano, Primo Levi, sobre campo de concentração.

Folha - Como decidiu escrever um livro sem metáforas?
Mills -
Não planejei. É como sei escrever. Não sou um poeta do século 18. E não gosto de adjetivos, prefiro contar a história pelo diálogo, como no teatro. No mais, o livro é uma grande metáfora.

Folha - Por que escrever sobre escoceses que odeiam ingleses?
Mills -
Morei na Escócia. Há 15 anos, vivi a realidade do livro, construindo cercas para fazendeiros ingleses. Na verdade, os escoceses podem ter qualquer nacionalidade. Pessoas na França e na Holanda me diziam que eles eram iguais àqueles caras. Meu livro foi traduzido até no Japão. Deve ter japoneses que se reconhecem nos personagens.

Folha - É intencional não acontecer nada no começo?
Mills -
As pessoas me dizem muito isso. A estrutura do livro é que é importante. Ele é construído do mesmo como se constrói uma cerca. Eu queria passar essa experiência de levantar os postes, esticar o arame, subir em morros, a lama, a chuva, todo o processo.

Folha - É um livro que dá um grande filme. O senhor recebeu ofertas para adaptá-lo?
Mills -
Sim.

Folha - De norte-americanos ou britânicos?
Mills -
Dinheiro norte-americano, com gente daqui. Mas eles querem mudar o final, que é surpreendente. E isso está intrigando os produtores. Eles não sabem o que fazer. Estão perdidos.

Folha - E o senhor vai deixar?
Mills -
Vou acabar deixando. Não estou ligando muito.


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