São Paulo, sábado, 02 de junho de 2007

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Novos animam letras peruanas

Autores revivem tempo de violência política e dos embates entre o Exército e o Sendero Luminoso

Principal expoente da nova geração, o escritor Santiago Roncagliolo tem o premiado romance "Abril Vermelho" lançado agora no Brasil


SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL

Um pôster turístico da cidade inca de Machu Picchu, no meio dos Andes, um folclórico líder autoritário de origem japonesa e as indefectíveis bolsas e ponchos que fazem o guarda-roupa de hippies e neo-hippies. São poucos os elementos que compõem o imaginário comum sobre o Peru. Os aficionados por futebol ainda lembrarão do trágico acidente de avião que matou todo o time do Alianza, principal equipe do país, em 1987. Mas as referências não vão muito além disso.
Um dos países mais pobres e isolados da América Latina, o Peru vive hoje uma surpreendente efervescência literária. O bom momento cultural corresponde à gradual recuperação da estabilidade democrática, que teve início com o fim do governo de Alberto Fujimori, e a derrota do grupo guerrilheiro Sendero Luminoso após a prisão de seu líder, Abimael Guzmán, em 1992.
Um grupo de jovens escritores vem amealhando prêmios e críticas favoráveis mundo afora, sendo traduzido não só para o inglês e o francês como para o russo, o búlgaro e o turco.
O principal expoente dessa geração é Santiago Roncagliolo, 32, cujo romance "Abril Vermelho", vencedor do prêmio Alfaguara de 2006, acaba de sair no Brasil. Trata-se de um thriller político, que utiliza o modo de narrar dos contos policiais tradicionais para contar a história de um misterioso crime na cidade de Ayacucho, antiga sede do Sendero.
"Um país sempre escreve sobre aquilo que não tem bem resolvido. No Peru, ainda tentamos entender o que se passou nesse tempo de violência política", disse à Folha.
O protagonista de "Abril Vermelho" é um promotor que quer esclarecer um crime cujas evidências apontam para o ressurgimento da guerrilha no local. Ele enfrenta resistência das autoridades locais, que não querem lidar com o impacto político negativo que teria a volta do grupo à ação.
"Esse personagem é inspirado na minha experiência como ativista de direitos humanos na região. Eu ia inocentemente, com a lei nas mãos, esperando que o horror tivesse a amabilidade de ajustar-se ao código civil. Fazia papel de ridículo." O Peru da década Fujimori (1990-2000) também é o tema dos outros autores que agora se destacam. Alonso Cueto, 53, que veio para a Flip (Festa Literária de Paraty) no ano passado, venceu o prêmio Herralde com "A Hora Azul" (Objetiva). O romance conta a história de um advogado que descobre que o pai, um oficial da Marinha, foi um torturador durante o embate entre Sendero e Forças Armadas.
O mais jovem é Daniel Alarcón, 29. Nascido em Lima, mas morando nos EUA e escrevendo em inglês, o autor reúne histórias baseadas no tempo em que viveu na periferia da capital peruana em "War by Candlelight". O livro foi finalista do prestigioso PEN/Hemingway e fez com que a revista britânica "Granta" o anunciasse como um dos melhores romancistas americanos jovens.
A nova geração é reverente com relação à tradição literária do país, que tem como ícones o poeta modernista César Vallejo, o ensaísta marxista José Carlos Mariátegui e o romancista Mario Vargas Llosa; mas valoriza sobretudo temas contemporâneos vistos de uma perspectiva bastante pessoal.
"O que há de mais importante na literatura em espanhol hoje é a realidade. É a razão do sucesso das revistas de jornalismo de autor, como a "Gatopardo" colombiana ou a nossa "Etiqueta Negra" [leia ao lado]". Agora, Roncagliolo está escrevendo um livro-reportagem sobre Guzmán, que utilizará documentação inédita sobre as ações do Sendero no país.


ABRIL VERMELHO
Autor:
Santiago Roncagliolo
Lançamento: Alfaguara/Objetiva
Preço: R$ 39,90 (289 págs.)


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