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ANÁLISE OBRA
Na dança do mestre, morte e vida alternam e se completam
INÊS BOGÉA
ESPECIAL PARA A FOLHA
Kazuo Ohno condensava o
tempo no movimento. Para
ele, era preciso suportar as
pressões, depois envolver-se
no movimento e com a energia acumulada "elevar-se, na
água da dança, como o linguado acima da areia".
Começou a dançar aos 43 e
não parou mais, mesmo nos
últimos anos, na cadeira de
rodas. Como ele dizia, "mover-se é procurar vida".
Verdadeiro mestre da dança, ele nos transportava com
seus gestos e sua presença
até outro espaço, onde se conectam o arcaico e o atual.
Foi um grande artista do butô
-estilo nascido no ambiente
da vanguarda japonesa.
O corpo e suas metamorfoses, o claro e o escuro, as memórias individuais e coletivas, a sexualidade, o inconsciente e o grotesco são temas
recorrentes dessa forma de
arte, que mudou a maneira
de pensar a dança no mundo.
"No butô os mortos podem se
transformar em força vital."
No Brasil, Ohno transformou o entendimento da dança por onde se apresentou.
Por aqui ele mostrou "Mar
Morto"; "Suiren" ("Ninféias"); "Ka Cho Fu Getsu"
("Flor, Pássaro, Vento e
Lua"); "Tendoh Chidoh"
("Caminho no Céu, Caminho
na Terra") e sua peça mais
emblemática, "Admirando la
Argentina" (1977), em que
encarnava o "amor e a dor da
vida cotidiana".
Para ele há sempre algo
começando e algo terminando: morte e vida se alternam
e se completam. Uma dança
da simplicidade, onde a força
surgia devagar e invadia os
sentidos arrebatadoramente.
Em cena, ele se via cercado
dos mortos e de espectadores. Agora, vida e morte redobram-se e multiplicam-se na
nossa memória, levando cada um a compreender o misterioso papel da arte: "o início é o fim e o fim é o início".
INÊS BOGÉA é diretora da São Paulo
Companhia de Dança
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