São Paulo, sexta-feira, 02 de julho de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ARTES PLÁSTICAS

CCBB carioca inaugura exposição, no próximo dia 12, com 40 dos participantes da versão original, de 84

Mostra ilumina caminhos da Geração 80

LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO

O senso comum de que a arte contemporânea é impenetrável para o público sofreu um revés em 1984, quando a exposição "Como Vai Você, Geração 80?" atraiu milhares de pessoas ao Parque Lage, no Rio. Embora sem manifestos por trás, era explícita a busca por uma comunicação com o público. Humor, figuração e elementos pop marcavam as obras.
De lá para cá, muitos dos artistas aprofundaram o lado conceitual de seus trabalhos. Puseram mais doses de "pensar" numa receita que priorizava o "fazer", para usar uma distinção comum na época. Observar o que eles eram e o que se tornaram é um dos objetivos de "Onde Está Você, Geração 80?", exposição que será aberta em 12 de julho no Centro Cultural Banco do Brasil do Rio.
"Não quis fazer uma retrospectiva, mas mostrar que caminhos eles seguiram", diz Marcus Lontra, curador em 1984 e novamente agora. Ele considera como grande feito da Geração 80 a opção pelo fazer, pela concepção das obras no momento em que eram feitas. "Antes, nos anos 70, tudo era pensar. Prevalecia um discurso umbiguista, da arte discutindo a arte, criando feudos de isolamento e pedantismo. Para ser inteligente, não é preciso ser ininteligível. A Geração 80 oxigenou a arte."
Dos 123 artistas que expuseram há 20 anos, 40 estão na mostra do CCBB. Outros oito que não estiveram, mas que são ligados àquele momento, foram convidados por Lontra. São os casos de Victor Arruda e dos paulistas do grupo Casa 7, como Nuno Ramos, Fábio Miguez e Carlito Carvalhosa.
"Queríamos realmente romper com a sisudez da época, mas isso não significa que não tivéssemos potência intelectual", avalia Nuno Ramos, 44, relativizando a dicotomia fazer-pensar. "Eu entendo essa distinção, mas não dá para dizer que Tunga, Waltercio [Caldas] e José Rezende não são do fazer. Arte conceitual é coisa de artista ruim. Quando é bom, deixa de ser conceitual."
Embora depois tenha seguido outros rumos, Nuno Ramos é um dos muitos que naquele momento apostaram na pintura. Desacreditada nos anos 70 por causa da hegemonia da dita arte conceitual ("A pintura era um tabu, uma coisa quase proibida", lembra Leda Catunda), ela voltava com força no mundo e no Brasil.
Daniel Senise e Beatriz Milhazes, dois expoentes da mostra de 84, continuam fiéis à pintura, mas não necessariamente aos princípios que marcaram o surgimento da geração. Senise, aliás, com suas carcaças e evocações do barroco, nunca comungou do humor que marcou a época.
"Havia uma crítica de costumes quase cartunística. Nossa atividade está muito mais elaborada. Eu estou até tentando recuperar um pouco daquele embate, aquele trabalho no ateliê sem saber o que vai acontecer", conta Senise, 49.
"Eu me conecto mais com os anos 90 do que com os 80, porque foi nos 90 que eu achei um fio condutor para me expressar melhor", diz Milhazes, 44. "A arte dos 80 era muito ligada ao pop. E eu tinha interesse nas artes decorativas, populares e na geometria. Sempre fui mais racional, tanto que só fazia umas cinco telas por ano. Depois, muitos deixaram a pintura. Eu permaneci e fiquei meio isolada no meio nacional."
Outros continuaram na pintura, mais ou menos fiéis ao pop. O paulista Ciro Cozzolino é dos fiéis. Na mostra há duas apropriações de signos conhecidos: "Tarsila Remartelada" (85) e "Zé Carioca Descendo o Rio Amazonas" (02).
"Sempre trabalhei com a citação de personagens e o humor. A iconoclastia é uma marca dos anos 80. Queríamos dar uma resposta à chatice dos anos 70, àquela prática de pôr um tijolo na parede e depois escrever um livro para explicar que é arte", diz Cozzolino, 45.
A exposição de agora recuperará alguns pintores de 84 que andam um pouco esquecidos. É o caso de Delson Uchôa, que impressionou ao retrabalhar ícones pop como o maço de cigarros Hollywood (a tela "Ao Sucesso", que está na mostra) e hoje faz trabalhos menos figurativos.


ONDE ESTÁ VOCÊ, GERAÇÃO 80?. Quando: De 12/7 a 28/9 (ter./dom., das 10h às 21h). Onde: CCBB/RJ (r. Primeiro de Março, 66). Quanto: entrada franca.


Texto Anterior: Popload: Diário da corte
Próximo Texto: Parque Lage sediou clima de festa
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.