São Paulo, quinta-feira, 02 de agosto de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Tenda dos milagres

Lenise Pinheiro/Folha Imagem
Cena de "O Pracinha da FEB", que integra o 17º espetáculo da companhia


Grupo Galpão celebra 25 anos com "Pequenos Milagres", peça baseada em relatos de pessoas comuns

VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

O médico homeopata João Celso dos Santos, 58, é o mais velho de nove irmãos. Em meados dos anos 60, um deles, Tarcísio, tinha 11 anos quando tomou um ônibus sozinho na rodoviária de Belo Horizonte rumo a São Paulo. Carregava uma sacola. Dentro dela, bem embrulhada, a cabeça cortada de um cachorro que havia mordido alguém da família. Suspeitava-se de raiva. A missão do moleque era entregar a "encomenda" a um tio que trabalhava num cartório na Sé e despachá-la para a Vigilância Sanitária.
Os desdobramentos dessa aventura são contados no novo espetáculo do Grupo Galpão, o drama "Pequenos Milagres", que estréia temporada paulistana amanhã no Sesc Anchieta, em montagem do diretor convidado Paulo de Moraes (da Armazém Cia. de Teatro).
"Cabeça de Cachorro" é a história que abre a noite e que vai costurando outras três narrativas -selecionadas entre 550 cartas enviadas à campanha "Conte Sua História", lançada no ano passado pelo Galpão para subsidiar o texto com o qual comemoraria seus 25 anos.
"Mandei oito histórias da família. Sete falavam de mim, e a oitava era essa, do meu irmão. Na verdade, quem cortou a cabeça do cachorro foi outro irmão, mas a dramaturgia achou mais interessante atribuir a ação a meu pai, morto há 40 anos. Apesar de inusitado, aconteceu de verdade", diz o médico Santos, morador do arraial de Macacos (MG). "Assisti ao espetáculo cinco vezes [no Cine Horto, em Belo Horizonte]. Fiquei bastante emocionado. O Galpão mostra que a arte está ao alcance de todos."
Em busca de homens e mulheres protagonistas ou testemunhas de passagens "milagrosas", Galpão e Moraes conjugaram ainda as memórias de um velho expedicionário que perdeu um amigo no front em "O Pracinha da FEB", inspirado em texto da atriz Thereza Alvarenga, 58; a mulher que acalenta por 20 anos o seu objeto do desejo em "O Vestido", da galerista Maristela de Fátima Carneiro, 53; e o desmonte de uma relação em "Casal Náufrago", depoimento cujo remetente preferiu o anonimato.
"Nosso desafio era como nos apropriar das histórias, mexer, criar estruturas narrativas, personagens, situações, enfim, transformar isso numa dramaturgia e contar as coisas com a linguagem do teatro", diz Maurício Arruda Mendonça, 43, co-autor da peça com o próprio Moraes, 42. O diretor diz que evitou o ilusionismo o mais que pôde. "Não queríamos cair na cilada de pôr em cena somente os relatos positivos." Como ele, o grupo afeito à farsa quer enfrentar as dores em bases mais realistas.


Texto Anterior: Horário nobre na TV aberta
Próximo Texto: Chegar aos 25 anos de grupo é "milagre", diz ator
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.