São Paulo, segunda-feira, 02 de agosto de 2010

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Simplicidade marca arte norte-coreana

Trabalhos retratam um país idealizado, com imagens de soldados, jogadores de futebol e trabalhadores sorridentes

Funcionários do Estado, artistas vivem melhor do que a média no pobre país; preço recorde de quadro é R$ 103,6 mil

Divulgação
‘Soldado’, quadro feito em 2008 pelo artista norte-coreano Jin Cheng Ji; obras do país são moda na China, que possui três galerias dedicadas exclusivamente à produção do vizinho

FABIANO MAISONNAVE
DE PEQUIM

Numa época em que o planeta está mais interconectado do que nunca, como se produz arte no país mais enclausurado em si mesmo?
Parte da resposta está à vista num crescente número de espaços em Pequim dedicados exclusivamente a pintores da Coreia do Norte.
Das três galerias que só trabalham com arte norte-coreana, duas foram inauguradas nos últimos dois anos, com centenas de pinturas expostas ou em estoque. Mas a grande quantidade não se traduz em trabalho variado.
As obras recentes são mais engajadas: trazem soldados e jogadores de futebol estoicos, trabalhadores uniformizados de sorrisos radiantes, com clara influência da União Soviética e da China pré-capitalista. Também há espaço para paisagens idílicas e muitos tigres.
"Há três adjetivos para definir a arte do país: simplicidade, graça e riqueza cultural própria", afirma o curador chinês Yi Hui Chun. "Os artistas na Coreia do Norte ainda estão subordinados ao Estado. Não há a influência do mercado, da arte moderna, do Ocidente nem tampouco de ideias abstratas."
A galeria mais importante é a Huachao. Funciona como uma espécie de franquia oficial do governo norte-coreano e seus artistas.
A maior parte das obras expostas ali é de autoria dos cerca de cem "artistas do povo", escolhidos a dedo pelo ditador Kim Jong-il. Como funcionários do Estado, vivem melhor do que a média no empobrecido país.
Segundo a gerente Chen Yin-fang, a procura tem aumentado. Quando a galeria abriu, há dois anos, os principais clientes eram colecionadores sul-coreanos, mas compradores chineses passaram a disputar os quadros.
Do ano passado para cá, o preço médio dos quadros na galeria saltou de R$ 1.300 para R$ 7.700. O preço recorde, alcançado num leilão neste ano, chegou a R$ 103,6 mil.
Os quadros são comprados do Estado pela galeria, mas os artistas sabem se sua obra foi bem-sucedida ou não, o que gera problemas.
"Os norte-coreanos não têm noção do que são direitos autorais", afirma Chen. "Quando um quadro faz sucesso, o autor se emociona e tenta pintar um idêntico, e outros artistas fazem igual."
A gerente conta que a galeria tem recebido quatro artistas norte-coreanos por ano, autorizados a visitar apenas para abrir exposições. "Eles compram muitos livros com fotos porque não têm acesso à internet e também levam material de pintura."
Enquanto países ocidentais isolam o regime comunista, a Coreia do Norte está de certa forma na moda na China, sua principal aliada. A atual turnê de uma companhia de ópera de Pyongyang pelo país lota teatros.
"A arte norte-coreana tem sido recebida na China como uma brisa e dá uma sensação de segurança sobre a apreciação da arte em meio à estética caótica dos tempos modernos", afirma Yi Hui.


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