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CECILIA GIANNETTI
Blogueiro com a cabeça no lugar
Se continuasse no Irã, Hossein Derakhshan estaria preso ou teria, literalmente, perdido a cabeça
SE A blogosfera fosse um balneário ensolarado, eu chamaria esse cara pra tomar um chope. E
se o jornalista e blogueiro Hossein
Derakhshan (aka Hoder) tivesse
permanecido em Teerã, onde nasceu, estaria preso ou já teria, literalmente, perdido a cabeça.
Hoder tinha 27 anos e uma coluna
diária sobre cultura e internet no
jornal "Asr-e Azadegan" (algo como
"Tempo dos Livres"), quando, em
2000, o aiatolá Khamenei mandou
fechar essa e outras 16 publicações,
incluindo o "Jameah" ("Sociedade"), primeiro jornal reformista iraniano.
Pego de surpresa, como centenas
de colegas jornalistas que ficaram
desempregados da noite para o dia,
mudou-se para Toronto, no Canadá.
O gosto por roupas modernas e
cultura pop já seria suficiente para
arranjar confusão em seu país de
origem. Hoder aumentou os riscos
recaindo no que os conservadores
iranianos qualificam de "Insulto aos
Profetas", criticando o líder fundamentalista.
"O presidente Mahmoud Ahmadinejad (eleito em 2005) é uma fraude e é uma marionete de Mesbah
Yazdi, um clérigo radical que só ganhou poder após a morte de Khomeini. Se existe uma pessoa no Irã
que o mundo devia temer é o aiatolá
Mesbah Yazdi", Hossein escreve em
seu blog, Editor: Myself (http://hoder.com/weblog), ponto de partida de nossa troca de mensagens.
Hoder fez mais que reclamar. A
repressão retomada por Khamenei
em 2000 fez com que o debate político migrasse para o espaço virtual.
Com um empurrão significativo
do blogueiro: ele provocou um levante reformista na web, movimentado principalmente por jovens, que passaram a mostrar em
diários na rede uma nova face do
Irã, abertamente insatisfeita com o
regime.
Para não perder o vínculo com os
leitores que deixara para trás, Hoder incentivou-os a fazer blogs.
Criou alterações no Blogger.com
que viabilizaram a publicação de
textos em persa e disponibilizou na
web um tutorial ensinando o be-á-bá dos blogs farsi, permitindo que
pudessem trocar informações sobre tudo o que jovens em qualquer
parte do mundo costumam gostar
-e a ditadura teocrática iraniana
reprime.
O relativo anonimato que caracteriza a ferramenta Blogger, no entanto, ainda não é suficiente para
proteger quem a utiliza no Irã. A
conseqüência pode ser cadeia e
tortura.
Seu blog está fora do ar há dias
-coisa incomum. Mas não vou
pensar no pior.
Hoder costuma viajar para falar
de tecnologia e alternativas ao regime iraniano vigente, a convite de
universidades e governantes. Briga
também contra a demonização do
Irã pelos Estados Unidos.
Quem acompanha o blog sabe:
num dia ele pode teclar de Toronto, na manhã seguinte de Londres,
Berlim, Tunísia e até Israel.
Está na hora de uma universidade brasileira chamá-lo para uma
palestra também. Finalmente pagaria ao Hoder os chopes devidos
pelas aulas sobre o Irã e lhe mostraria nossa guerra particular.
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