São Paulo, sexta, 2 de outubro de 1998

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TEATRO
Estréia acontece amanhã na Áustria
Thomas dirige a "ópera fundamental'

Divulgação
Cena de Moisés e Arão", ópera de 1928 dirigida por Gerald Thomas


da Reportagem Local

A mais fundamental de todas as óperas. Um espetáculo encenado apenas sete vezes na história. Um palco rotativo. Uma montanha que anda. Em cena, 354 pessoas.
Todas essas são definições parciais de "Moisés e Arão", novo espetáculo de Gerald Thomas que estréia amanhã em Graz, na Áustria, e fica por lá mesmo, onde será apresentada apenas sete vezes.
Segundo Thomas, a apresentação é histórica. "Esse é meu último projeto aqui e o mais importante", afirma o diretor, que está há cinco anos na Áustria. "Há três anos trabalho nesse projeto. É o espetáculo mais demorado e mais discutido da minha carreira, sem sombra de dúvida."
"Moisés e Arão" retrata a discussão entre Moisés e Arão ao pé do monte Sinai. O primeiro acha que Deus é invisível e não pode ser representado. O segundo acha que as massas devem receber o que querem e propõe um carneiro de ouro representando a divindade.
"É a mais fundamental de todas as óperas. É a discussão fundamental na qual a vida é baseada", afirma.
"Discussão entre materialismo e espiritualismo. É o que classifica o século 20 mais do que qualquer outro século por causa dos regimes comunistas, que deram mais valor a um do que a outro, e à "forçação' do capitalismo, que privilegiou outro e não um."
Não só isso, o tema -a fuga do povo judeu dos egípcios- também remete ao nosso século. "A perseguição dos faraós evidentemente traz uma analogia direta com o que aconteceu aqui na Áus tria há 50 anos, Hitler... Schoenberg é austríaco."
Trata-se de Arnold Schoenberg, que compôs a ópera em 1928. Nunca a terminou. "Ele não concluiu o terceiro ato, ficou tentando voltar até os anos 50, quando morreu.
Mesmo antes de ser encenada, "Moisés e Arão" já é um sucesso. Os ingressos para as sete sessões -2.200 lugares cada- estão esgotados há semanas. Sendo assim, por que apenas sete apresentações? E por que apenas na Áustria? "Essa ópera só foi encenada sete vezes na história. Além do coro normal, há um coro extra e outro convidado. Poucas casas do mundo têm capacidade física e financeira de abrigar isso. A ópera ficará alguns anos no repertório, mas quando voltar, será em versão reduzida", explica Thomas.
A versão que estréia amanhã traz nada menos que 354 pessoas, entre eles uma orquestra de 104 músicos, 23 cantores solistas, coro de cem pessoas e 17 maestros assistentes. De brasileiros, apenas uma bailarina e a figurinista Gilda Barbosa, que desenhou 170 roupas. "Não haveria avião que coubesse", brinca Thomas.
O palco, desenhado pelo arquiteto austríaco Guenther Domenig, também é monstruoso. "É muito tecnológico, complicado. O Monte Sinai é uma estrutura enorme, que tem pernas, cada uma delas acionada por um motor diferente. Quando eu olho para a estrutura com o cara lá em cima, é assustador. Essas coisas só são possíveis aqui na Europa. Não é possível na América Latina." Outro ponto de dificuldade na encenação da ópera é que "Moisés e Arão" seria a primeira ópera dodecafônica, que dá início ao sistema de doze notas. O dodecafonismo é um sistema de composição criado por Schoenberg que usa 12 semitons em vez dos oito habituais. "É extremamente difícil para os cantores memorizarem as notas. O coro está ensaiando há dois anos. Os solistas, há seis meses", diz Thomas.
Para o diretor, essa é uma das razões de a ópera representar o âmago de Schoenberg. "Por um lado, ele era eruditíssimo criando a dodecafonia e a música atonal e sendo odiado por isso. Por outro, era um romântico absoluto, que queria ser adorado e dar aquilo que o público queria ouvir. Então, há Moisés e Arão dentro dele."
(IVAN FINOTTI)



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