São Paulo, quarta-feira, 03 de janeiro de 2007

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A volta de Dom Salvador

Pianista e compositor paulista, radicado nos EUA, grava seu primeiro disco no país depois de 35 anos e fará jam no Rio

CARLOS CALADO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Ele ainda se emociona ao recordar as homenagens que recebeu, três anos atrás, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Em duas concorridas noites do festival Chivas Jazz, o pianista e compositor Dom Salvador interrompeu um afastamento de 30 anos dos palcos brasileiros.
"Foi inesquecível. Como estava ausente do país por tanto tempo, eu não esperava encontrar tanta receptividade", diz o músico de 68 anos, que se mudou para os Estados Unidos, em 1973, já reconhecido como líder de originais trios de samba-jazz e da banda Abolição, pioneira nas fusões do samba com o soul e o funk.
A carreira de Salvador decolou em São Paulo, no início dos anos 60, em boates como a Baiúca e a Cave. Em 1964, seu piano já brilhava nas jam sessions do Beco das Garrafas, lendário reduto da bossa nova, no Rio. Gravações e shows ao lado de astros da MPB, como Elis Regina, Jorge Ben e Edu Lobo, aumentaram seu prestígio.
Hoje, depois de passar as festas de final de ano em Rio Claro, cidade do interior paulista onde nasceu, Salvador se prepara para quebrar um hiato ainda maior em sua carreira. No próximo dia 8, no Rio, o pianista vai começar a gravar seu primeiro disco no Brasil em 35 anos. O último foi o inovador "Som, Sangue e Raça" (1971), seu único álbum com a banda Abolição.
Nessas novas gravações, Salvador pretende resgatar o projeto do Rio 65 Trio, cultuado grupo de samba-jazz que formou com o baterista Édison Machado (morto em 1990) e o baixista Sérgio Barroso, em meados dos anos 60. De vida curta, esse trio só gravou dois LPs, que chegavam a ser vendidos por centenas de dólares até 2003, quando foram finalmente editados em CD.
Na nova versão do trio, que volta a incluir o baixo acústico de Sérgio Barroso, Salvador contará com a participação de Duduka da Fonseca, baterista que também vive nos EUA. "O Duduka é um seguidor do Édison Machado. Só ele poderia substituí-lo", justifica o pianista e líder, que planeja gravar nesse álbum apenas composições próprias.

Jam session no Rio
Antes do início das gravações, Salvador fará uma apresentação no palco da megastore Modern Sound, no Rio, na próxima sexta-feira. "Deve virar uma jam session, um negócio informal. Vou chamar os amigos", avisa ele.
Em Nova York, onde mora, Salvador toca cinco vezes por semana no River Café.
"O público é meio conservador, mas eu toco um pouco de tudo lá", diz, ressaltando que, após 29 anos como pianista dessa casa, conseguiu ter liberdade total para misturar música brasileira aos tradicionais standards de jazz.
"Tenho sentido que as pessoas estão cada vez mais interessadas na música brasileira. Até porque não está acontecendo nada de novo na música norte-americana", afirma, mencionando o Zinc Bar, outro ponto de referência dos fãs da música brasileira em Nova York, no bairro de Greenwich Village. Ali se apresenta, há quase uma década, o pianista gaúcho Cidinho Teixeira, com o qual Salvador lançou em 2006 o álbum "Ancestors", ainda inédito no Brasil.

Choro
Outro motivo recente de alegria para Salvador foi saber que o Choro Ensemble, grupo de músicos brasileiros que há anos interpretam nos EUA um repertório centrado no choro, está preparando um álbum só com choros de sua autoria.
"Misturo muita coisa em minhas composições: samba, maxixe, cateretê, baião", comenta o pianista, que costuma se referir à sua música como "afro-brazilian jazz" (jazz afro-brasileiro). "Lá [nos Estados Unidos] tudo é marketing. E quando você fala em música brasileira para um norte-americano, a primeira coisa em que eles pensam é bossa nova ou samba. Quero que eles entendam que minha música não é só isso."


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