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Entre a tradição e a modernidade
Após aguardada promoção à categoria máxima do "Michelin", Yannick Alléno acompanha a transformação do tradicional hotel Le Meurice, na França
JOSIMAR MELO
CRÍTICO DA FOLHA, EM PARIS
Entre os chefs franceses promovidos, no início do último
ano, às três estrelas (cotação
máxima) pelo guia "Michelin",
o nome mais comentado foi o
de Anne-Sophie Pic (que esteve
há pouco no Brasil e que pertence à terceira geração de uma
família triestrelada de chefs),
pelo bom motivo de passar ela a
ser a única mulher neste universo que hoje agrega 26 restaurantes na França.
Mas há outro nome cuja ascensão vinha sendo aguardada
e finalmente se concretizou: o
do chef Yannick Alléno, 38
anos, do restaurante do hotel
Le Meurice. Promoção que
acontece no bojo de uma interessante transformação neste
que é um dos hotéis mais tradicionais e luxuosos da França.
O que pensar de um hotel
fundado em 1835, com uma arquitetura absolutamente clássica fincada ao pé do jardim des
Tuileries, no centro de Paris,
que ousa chamar o frenético arquiteto Philippe Starck para renovar suas áreas comuns?
Pois se você pensar em
termos de cozinha, algo parecido, embora menos espalhafatoso, vem acontecendo depois
da chegada de Alléno ao hotel,
em 2003.
Dedicação integral
Que cozinha é esta? "É uma
cozinha parisiense", resume
o chef, que não é de muito falar
(diz que prefere trabalhar,
coisa que faz, afirma, quase
todo o tempo -ficando o pouco
que resta para a família e
para dormir).
O tema da cozinha regional
tem sido objeto de estudo e
pesquisas, sendo seu objetivo
codificar as criações e tradições
culinárias locais. De fato, é de
Paris (e sua região, ou Província: a Île-de-France) que vem
muito da inspiração de Alléno:
de pratos como o "pot au feu" de
Dodin Bouffin (cozido que homenageia o antigo restaurante
que foi o preferido do ex-presidente Mitterand) e maçã do
amor, ao uso de ingredientes
locais, como o agrião de Montmorency ou o mel produzido
nas colméias do... teto da
Ópera de Paris.
Mas o chef não tem um
prato de assinatura, como
aqueles que celebrizaram vários chefs -o salmão com azedinha de Troisgros, a sopa de
trufas de Bocuse, o purê de batatas de Robuchon, o gâteau
coulant de Michel Bras. Ele
muda completamente o cardápio a cada estação.
A ascensão
Nascido num subúrbio de
Paris, Alléno acompanhou o renascimento da cozinha de restaurantes de hotéis. Foi neles
que fez sua carreira. E foi em
um deles -o hotel Scribe, de
Paris- que obteve sua primeira
estrela no guia "Michelin", em
2000, e a segunda, em 2003.
Neste mesmo ano, transferiu-se para o Le Meurice, onde obteve duas estrelas em 2004 -e
em 2007, a terceira.
Mesmo defendendo uma cozinha calcada nas tradições parisienses, a alta gastronomia de
Yannick Alléno evidentemente
não dispensa inspirações de
outras origens e muito menos
ingredientes superlativos vindos de outras regiões.
Uma recente refeição, realizada ali neste inverno parisiense, não poderia contornar itens
de estação como as trufas e
as caças, como ficou demonstrado no menu-gastronômico
provado (custa 190; com trufas brancas, 490; com vinhos
harmonizados, mais 130).
Para despertar o paladar,
uma vaporosa omelete com
pernas de rã em molho de salsinha. Em seguida, agnolotti de
alcachofra e parmesão com
trufa branca e chantilly de rúcula, que antecederam fresquíssimas conchas cruas com
ouriço-do-mar em geléia de repolho-roxo e zimbro. Próximo:
simples e deliciosa vieira com
linguini ao creme e trufas.
Depois um estupendo e
cremoso "foie gras iodado em
pão de açúcar" (envolto em algas e cozido dentro de uma pedra de açúcar) com chutney de
nabo e algas.
E um vigoroso prato de caça:
grouse (tetraz, ave caçada na
Escócia) assada no malte uísque envelhecido, com quenelles de batatas.
Como queijo, um creme de
brie de Meaux com trufas e salada. Como sobremesa, maçã
do amor com framboesa e jasmim, depois "fuso" crocante
com chocolate e lâminas de
trufa branca além de um sem-número de pequenos quitutes.
O jornalista JOSIMAR MELO viajou a convite do
hotel Le Meurice e da companhia aérea Swiss International
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