São Paulo, quinta-feira, 03 de fevereiro de 2011

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comida

Em busca do gelo perfeito

Para melhorar a qualidade dos coquetéis , bartenderes estão à procura de gelos que derretam menos e resfriem mais ; comparados aos exemplares europeus, americanos e japoneses, os gelos no Brasil têm qualidade inferior e interferem na bebida

LUIZA FECAROTTA
DE SÃO PAULO

Pegue uma pedrinha de gelo e coloque-a diante da luz. Observe-a. Certamente irá notar microfuros, uma cor esbranquiçada e, em pouco tempo, ela vai começar a se desfazer entre os dedos.
Isso quer dizer que ali há oxigênio e, portanto, pouca pressão. Trata-se de um gelo fraco para coquetéis -derrete rapidamente. Pressão, ao contrário, é desejável: provoca mais resfriamento e menos degelo, como explica o mixólogo Márcio Silva, que está à frente das casas da Cia. Tradicional de Comércio, como o SubAstor, que revisita drinques clássicos.
Empenhado em seus estudos sobre o gelo, Silva pretende trazer ao Brasil uma máquina que produz barras sólidas que podem ser manipuladas sem que isso interfira no sabor do drinque.
"O campo do bar está ficando muito preciso. Alguns bartenderes estão estudando energia, cocção. De uma certa forma, profissionais estão se conscientizando de que, quanto mais entenderem os estados físicos da água, melhor poderão executar drinques", diz o mixólogo e também engenheiro químico.
Ele pretende revitalizar as estações de bar do grupo e dará, assim, mais ênfase ao gelo. "O SubAstor lembra os bares de Nova York, de 1910 a 1930. Preciso estudar que tipo de gelo eles utilizavam naquela época, quando poucos bares tinham máquinas. O gelo vinha das montanhas, com muita pressão."
Para o professor da Associação Brasileira de Bartender, Luís Cláudio Simões, bateu-se muito nessa tecla, da qualidade do gelo, desde o ano passado. "Gelo em bloco é mais sólido, tem uma textura diferente, demora para derreter, tem uma apresentação visual melhor e não altera tanto a bebida."
Bebidas cobradas em bares, a preços altos, diga-se.

DESAFIO
Essa é a luta dos barmen de São Paulo. Encontrar um bom gelo para entregar ao cliente a melhor bebida.
Henrique Medeiros, do Kinoshita, garimpa os gelos de melhor qualidade dentro de um saco cheio deles. Como? Ele busca pedras mais uniformes e mais translúcidas. "Estamos atrasados nesse assunto se considerarmos Europa e Estados Unidos. É uma briga, o gelo interfere totalmente na bebida."
Marcelo Serrano, do MyNY, trabalha com cinco tipos de gelo. Para cada um há um uso específico. "É o nosso tempero essencial. Compare com o sal na comida."
A água também recebe tratamento especial. É fervida uma vez, descansa até esfriar, é fervida novamente, fica morna e, então, é colocada no molde e, em seguida, no freezer. Esse processo ajuda a retirar oxigênio, o que resulta em um gelo "mais translúcido, mais nítido".
Talita Simões, do At Nine, explica que drinques gelados são mais fáceis de beber. "Faz com que você não sinta tanto o teor alcoólico, fica mais suave. Em degustação de vodca, por exemplo, tomamos na temperatura ambiente. Fica com sabor mais forte e mais persistente."
Segundo Medeiros, do Kinoshita, quem faz produção própria de gelo, um costume já antigo em países como o Japão, tem uso limitado por conta da quantidade.
Soma-se a isso o alto custo: "Não é só o equipamento para solidificar. A água tem de ter um tratamento especial". Para ele, "todos caem no mesmo problema: precisa de espaço e local adequado para armazenar".
Aí está um desafio para os bartenderes, que cobram drinques por valores cada vez mais altos, com gelo que ainda deixa a desejar.


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