São Paulo, sexta-feira, 03 de março de 2006

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MÚSICA

Homenageado em 1973 por Caetano Veloso e, recentemente, por grupos como Pato Fu e Mombojó, cantor reaparece

Odair José mostra o "outro lado" da MPB

RONALDO EVANGELISTA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Com disco novo saindo do forno e recém-homenageado em tributo por jovens artistas insuspeitos, como Mombojó, Pato Fu e Los Pirata, entre vários outros, o cantor e compositor Odair José é o maior representante da chamada música "brega" que teve seu auge nos anos 70. Com vendas de discos sempre muito maiores do que de artistas como Chico Buarque e Caetano Veloso. Caetano, aliás, foi o primeiro artista de prestígio a chamar atenção para Odair, com quem se apresentou num evento da indústria fonográfica (a Phono), em 1973.
A importância de Odair também é reavaliada no livro "Eu Não Sou Cachorro, Não", de Paulo Cesar de Araújo, que tem o cantor como um dos personagens principais. O novo tributo segue o mesmo caminho e se esforça para deixar Odair com cara mais "descolada", ao mesmo tempo em que o próprio lança disco seguindo a própria tradição brega.

 

Folha - Você se sente parte da MPB?
Odair José -
A minha música faz parte da história da música brasileira. MPB, para mim, é música popular brasileira. Agora, existe a música popular de Ipanema, e dessa eu não faço parte. Tem pessoas que acham que só eles podem fazer parte da história, da maneira deles. Outro dia mesmo vi na televisão uma coisa absurda. Aquele cara que toca violão e é casado com uma americana, Carlos Lyra, dando uma entrevista dizendo "a gente não era como Francisco Alves e Ângela Maria, éramos rapazinhos de classe média alta que faziam música de bossa nova para tocar no nosso ambiente chique". Ah, deixa de ser babaca. Quem é de classe média alta e é chique não precisa falar essas coisas. Mesmo porque todos os cantores da bossa nova são cópias do João Gilberto. E o João Gilberto vem do interior da Bahia, não é de classe média alta. O João Gilberto faz música para o povão.

Folha - E quando você compunha, tinha essa intenção de fazer música para o "povão"?
Odair José -
Eu já escutei de Beethoven a Luiz Gonzaga, de rock pesado a Steely Dan e Crosby, Stills, Nash & Young. Mas as minhas informações, até por eu mesmo querer, foram sempre as mais simples. Eu descobri que sou, na verdade, um repórter musical. A intenção de chegar no povão havia porque a intenção era fazer uma reportagem da vida das pessoas. Eu poderia fazer uma crônica do milionário que mora na Vieira Souto, porque tanto faz o cara ter US$ 1 bilhão ou ter R$ 1.000, porque se ele estiver apaixonado ou tiver um problema existencial, vai ser a mesma coisa. Só que um vai sofrer num ambiente chique e o outro, num pobre. Um vai beber uísque da melhor qualidade e o outro, cachaça.

Folha - E porque você sempre escolheu fazer referência à vida de pessoas "excluídas", como prostitutas e empregadas?
Odair José -
Foi algo que aconteceu naturalmente, que eu observei. No meu começo de carreira, fiquei dois anos tocando violão em cabarés do Rio e convivi com esse tipo de gente. O que eu canto, eu vi acontecer muito naqueles bares. Eu percebi na época que já existiam vários segmentos musicais estabelecidos. O Roberto Carlos já tinha seu estilo. Ele cantava o amor do portão, do namoradinho, o beijo roubado, "eu te darei o céu". Quando, na verdade, os namorados já estavam indo para a cama, não estavam mais ficando no portão. O amor já tinha ficado adulto, e eu entrei para cantar esse amor adulto.


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