São Paulo, sexta-feira, 03 de março de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ÚLTIMA MODA
EM PARIS

Menos ornamentos e mais arquitetura

A idéia ambiciosa de que a moda possa ser um misto de arte, ritual, glamour, comércio, pensamento e imagem determinante da época ganha em Paris uma força sem igual. Por isso, centenas de jornalistas e compradores vindos de todo o mundo parecem se importar pouco com o frio cruel, o vento gelado e a chuva intermitente que têm composto a atmosfera da cidade desde o domingo, quando começou o prêt-à-porter de outono-inverno -que segue até domingo próximo, somando 86 desfiles principais.
Se o céu noturno está limpo, sem nuvens, pode-se ver a Torre Eiffel coberta de milhares de pequenas luzes, como se vestisse um manto de lantejoulas faiscantes. Nas passarelas, porém, o brilho foi praticamente banido das coleções, e com ele grande parte dos encantamentos barrocos, rococós e românticos que dominaram as últimas estações.
A temporada sela o fim da ornamentação e dos efeitos ultradecorativos nas roupas -e ao mesmo tempo da feminilidade sentimental que governou boa parte da moda nas últimas "saisons". Os primeiros dias em Paris foram marcados pela volta da pesquisa arquitetônica das silhuetas, pela ênfase na experimentação com materiais, volumes e proporções, por uma série de looks de linhas enxutas, com formas modernistas ou neominimalistas, frequentemente severas e às vezes ousadas, nas principais coleções. De quebra, emergiu uma iconografia jovem, destemida, sofisticada e quase intelectual da mulher -tendência também presente em Milão, com Prada e Jil Sander.
O estilista francês Nicholas Ghesquière, da maison Balenciaga, esteve, até agora, na linha de frente da moda neobarroquista. Curiosamente, foi ele mesmo quem criou em Paris a coleção que melhor explorou os novos caminhos e a nova feminilidade. Ghesquière releu toda a obra -temas, cores, formas- de Cristóbal Balenciaga (1898-1972), atualizando-a. O resultado é magnífico, uma conversa inteligente, sofisticada e extremamente charmosa entre o gosto de nosso tempo e o modernismo do mestre espanhol.
Yohji Yamamoto apresentou a segunda coleção mais poderosa em Paris. As roupas em tamanhos superdimensionados desafiam os clichês da sensualidade e oferecem uma imagem muito contemporânea, forte e estranhamente leve da mulher. São peças de incrível elaboração, com cortes e abotoamentos que brincam com o fora e o dentro, a frente e as costas das roupas. Mais que desconstruções, as roupas propõem reconstruções livres.
Duas vibrantes coleções também se destacaram nos primeiros dias: a de Vivienne Westwood e a de John Galliano para a Dior (com um ótimo e modernizador design das peles). Westwood e Galliano são ingleses, e foram os dois que conseguiram quebrar certa severidade do início da temporada, graças à liberdade estilística que os caracteriza e à inclinação de ambos para o pop -gosto que, às vezes, faz tanta falta às exibições parisienses.

EM MILÃO

Um grand finale com Dolce

A temporada outono-inverno 2006-2007 de Milão, que terminou no último sábado, teve duas coleções determinantes para a moda nos próximos tempos: a das garotas "selvagens" e intelectuais da Prada e a das meninas neominimalistas de Raf Simons para a Jil Sander -grife alemã que era da Prada e cuja venda para um grupo britânico foi anunciada no final da "saison" italiana. Mas outras marcas apresentaram boas coleções no fim da temporada, embora com doses menores de ousadia.
A Dolce & Gabbana fez um interessante espetáculo com uma série muito sexy de looks inspirados em uniformes militares (sobretudo o napoleônico). A grife pontuou e encerrou o desfile com levíssimos e sofisticados vestidos estilo império, de sensualismo mais etéreo, para contrabalançar a tensão do estilo masculino. Aliás, citações da vestimenta masculina apareceram bastante nas temporadas de Milão e Paris.
A Versace optou por não fugir de seu gosto por uma feminilidade ostensiva, mas reduziu as extravagâncias. Criou uma coleção forte, inspirada tanto nos anos 60 quanto nos 80, com uma imagem segura e impositiva da mulher, seja na série de minissaias ou nos longos com cortes faustosos nas pernas -tudo baseado num design geométrico a partir das letras V, X, Y, W e Z. A coleção da Burberry, desenhada por Christopher Bailey, foi um "tour de force". Como a grife festejou no desfile os seus 150 anos, o estilista inglês exibiu looks que recriam clássicos da Burberry. A entrada final dos modelos com guarda-chuvas, debaixo de uma tempestade de flocos dourados, comoveu o público.


ALCINO LEITE, com Viviane Whiteman - ultima.moda@folha.com.br

Texto Anterior: Rapper Slim Rimografia lança LP com influências de jazz e MPB
Próximo Texto: Televisão: SBT planeja "Jornal Hoje" para Nascimento
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.