São Paulo, segunda-feira, 03 de abril de 2006

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MÚSICA

Em entrevista à Folha, crítico americano comenta relação com o rock

Obra traz ensaios ácidos de Greil Marcus

ALEXANDRE MATIAS
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

"É um encontro cara a cara com todo o terror que a mente consegue juntar; movendo-se rapidamente sem jamais brecar, para que homens e mulheres tenham que vencer o terror em seu próprio passo." Toda tensão da descrição acima parece referir-se a um momento histórico e emblemático -e realmente é. É assim que o crítico musical norte-americano Greil Marcus se referiu, à época, à "Gimme Shelter", dos Rolling Stones.
Um dos textos mais respeitados quando o assunto é música popular do século 20, Marcus é um dos responsáveis pela edificação da importância histórica do rock, que lhe deu sobrevida para além dos anos 60 e o mantém de pé até hoje. Ao lado de nomes como Richard Meltzer, Nik Cohn e Lester Bangs, ele compôs a primeira geração de críticos de rock como observadores da sociedade.
Uma amostra de sua obra foi reunida na coletânea de ensaios "A Última Transmissão" (Conrad, 160 páginas, R$ 24,50). Ele conversou com a Folha por e-mail e falou sobre seu livro mais recente, "Like a Rolling Stone", dedicado unicamente à canção de mesmo título de Bob Dylan.

Folha - Como você se envolveu com a crítica musical? Você imaginava que escrever sobre música se tornaria uma carreira?
Greil Marcus -
Comecei a escrever sobre música na universidade, para as aulas, em 1965. Em 1968, comecei a escrever para a "Rolling Stone". Achava que as resenhas da revista eram ruins -pois escreviam apenas sobre as letras e não sobre o som- e pensei que eu pudesse fazer melhor. Eu não tinha a menor intenção em fazer uma carreira escrevendo sobre música até que dei aula em Berkeley por um ano e descobri que eu não sirvo para ser um professor. Eu não tenho paciência com os alunos. Por isso, parei de dar aulas. Comecei a escrever um livro sobre rock'n'roll e cultura americana, que retomava todo o trabalho que eu havia feito em Berkeley. Foi publicado em 1975, com o título de "Mystery Train".
Desde então, escrevi em vários periódicos, escrevi livros e dei palestras. Comecei a dar aulas novamente em Berkeley e Princeton, onde continuo a lecionar até hoje. Desde então, aprendi a ser paciente e ouvir os alunos, em vez de lhes dizer como pensar.

Folha - A crítica é necessária ao trabalho do artista?
Marcus -
Não.

Folha - Então, por que continuamos lendo e escrevendo sobre arte e música?
Marcus -
Algumas pessoas podem escrever sobre arte de uma forma que amplia a experiência que já existe originalmente, ou a sensibilidade que ela pode trazer. Mas eu também não acho que a arte precisa ser explicada para ser compreendida. Eu sempre acreditei que tudo que estou fazendo é elaborar respostas que qualquer um pode ter em relação a certos artefatos ou eventos estéticos. Não estou contando nada que eles não saibam, estou apenas retirando a resposta que já está presente.

Folha - Você acha que a música está perdendo seu valor emocional, à medida em que estão disponíveis a um clique do mouse e enquanto a indústria do disco a trata apenas como um produto?
Marcus -
Não sei. Outro dia, ouvi "Concrete Jungle", dos Wailers, no rádio e foi como se eu nunca a tivesse ouvido. Parecia sobrenatural, com sua força e profundidade. As pessoas continuam fazendo música pelos mesmos motivos de sempre: para sentir o que outros sentiram quando fizeram os sons que fizeram.

Folha - Como "Like a Rolling Stone" virou um livro?
Marcus -
Culpa do Clive Priddle, editor da ForeignAffairs de Nova York, que me ligou e disse que queria que eu escrevesse um livro sobre a canção. Eu disse "não", mas eu não conseguia parar de pensar naquilo. Me encontrava escrevendo notas e até escrevi a introdução em menos de uma hora. Tornou-se um desafio. O escrevi muito rapidamente.


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