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TEATRO/CRÍTICA
Espetáculos de Miguel Falabella e Diogo Vilela evocam personagens nacionais de maneiras opostas
Musicais resgatam a auto-estima brasileira
SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA
Há em cartaz na cidade dois
musicais sobre mitos da
MPB. Miguel Falabella apresenta
a trajetória de Carmen Miranda;
Diogo Vilela, a de Elis Regina. A
razão para a coincidência está na
ponta da língua: quem não pode
mais ir à Broadway por questões
econômicas e políticas anda ávido
por encontrar por aqui mesmo
não só um teatro musical com a
mesma qualidade técnica, mas
que resgate temas e valores brasileiros, nossa "auto-estima", como
diz Falabella. Em nome desta
"Broadway paulista" é cogitada
até a reforma do bairro do Bexiga.
Apesar de desafios técnicos em
comum, como a capacidade de alternar fala e canto sem perder o
compasso e, se possível, a naturalidade, assim como evocar personagens históricos sem ceder demais à caricatura, o espetáculo de
Falabella e de Vilela se opõe em
pontos cruciais.
"South American Way" apresenta Carmen Miranda voltando
ao Brasil em 1954, magoada por
estar sendo vista como "americanizada". No porto, encontra a si
mesma jovem, o que dá margem a
um flashback não convencional,
além de possibilitar que duas cantoras se alternem na interpretação
de seus sucessos.
Figurinos e coreografias são reproduzidos com zelo, o que é mérito questionável, dado o mau
gosto que imperava na época. A
atmosfera de simulacro é ostentada como valor: Carmen questiona
abertamente ter que dançar rumba em nome de uma efêmera "política de boa vizinhança", mas se é
isso que tem de fazer pela sua pátria, não foge à luta. É roubada pela empregada, faz um casamento
infeliz com seu empresário, mas
esse é seu destino, como vaticina
uma cigana que fornece ao público as informações necessárias.
Não importa a falcatrua, importa chegar lá. Lá, na Broadway,
mesmo que seja dentro de um
carrinho alegórico de néon, empurrada por um solícito contra-regra. Não cabe aqui nenhum distanciamento crítico: Carmen é
uma heroína intocável, desdobrada em duas solistas que rivalizam
nos agudos e um elenco de apoio
medíocre.
"Elis, a Estrela do Brasil" evita
esse tipo de hagiografia assumir
com bom humor o tom caricatural. A família "caipira" de Elis,
com seu sotaque gaúcho, parece
ter saído de "A Era do Rádio", de
Woody Allen, sobretudo pelo carisma de Marcos Oliveira e de Malu Valle e a empatia de Bruno Miguel, que faz o irmão de Elis com
competente simplicidade. Inez
Viana abusa às vezes de sua capacidade de imitar Elis, mas roteiro
e direção sabem conduzi-la pela
exposição de suas incoerências.
A peça, assim, se torna épica,
com saltos de tempo e atores que
sabem se dirigir diretamente ao
público sem perder o personagem, como Cláudio Lins e Jandir
Ferrari. Mais importante, todos
cantam, e bem, por menor que seja a participação.
Porque, no fundo, quem encanta nesse musical não é Elis e seus
amigos, mas seus intérpretes. A
sua morte foi uma perda irreparável, mas a saudade que se evoca
não é a de um museu de cera, mas
de padrões que continuam válidos e são resgatados com emoção.
Não se trata tanto de colher a flor
que já não há, mas de semear a
próxima colheita.
Elis, a Estrela do Brasil
Direção: Diogo Vilela
Onde: Centro Cultural Banco do Brasil (r.
Álvares Penteado, 112, SP, tel. 0/xx/11/3113-3651)
Quando: de sex. a dom., às 18h30; até 26
de maio
Quanto: de R$ 7 a R$ 15
South American Way
Direção: Miguel Falabella
Onde: Procópio Ferreira (r. Augusta,
2.823, SP, tel. 0/xx/11/ 3083-4475)
Quando: de qui. a sáb., às 21h; dom., às
18h; até 18 de agosto
Quanto: de R$ 35 a R$ 80
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