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28ª MOSTRA
Diretor português vem ao Brasil exibir seu mais recente longa, "O Quinto Império", sobre o mito do rei Sebastião
Manoel de Oliveira faz jornada histórica
CLAUDIO SZYNKIER
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Manoel de Oliveira é, por excelência, um cineasta da história.
Em conversa com a Folha, suas
palavras a respeito de seu novo filme, "O Quinto Império - Ontem
como Hoje", possuem curioso sabor de aula de história.
O longa é uma jornada através
das paredes e interiores do castelo
do rei Sebastião. Oliveira atualiza
o mito de Sebastião em atmosfera
"histórica" forte, via jogo de luzes,
sombras e decoração. Porém seus
temas estão relacionados ao hoje.
SEBASTIÃO - CRISTO
Sebastião desapareceu, ficando
como o "encoberto", pois não se
sabia se ele havia desaparecido,
fugido ou morrido. O país foi
abaixo, ocupado pela Espanha, e
veio a crença de que ele viria em
uma manhã de nevoeiro, cavalgando em um animal branco.
Mas os filósofos, após muito tempo, transportaram a idéia de Sebastião para a idéia do Messias e
desta, para a idéia de Cristo. Ou
seja, Sebastião se configuraria em
Deus, de volta à Terra. Sebastião,
o "desejado", em sua volta, seria o
alcance da paz e da harmonia entre os homens, algo messiânico.
Um mito de um novo tempo, que
veria o renascimento do amor,
com o fim das guerras.
CONTRADIÇÃO?
Sebastião não tinha sede de sangue. Ele tinha um espírito implacável, pois, se os árabes durante
600 anos aceitaram Cristo, depois
surgiu Maomé, que entendia que
deveria haver uma religião que representasse a eles, árabes. E a formação da Europa se dá nessa cruzada contra a religião muçulmana, que para os cristãos desvirtuava sua própria crença. Além disso,
Sebastião era um predestinado.
Seu avô teve 14 filhos. Morreram
todos, sobrou apenas o mais novo, que se casou às pressas com
uma princesa. E o mais impressionante, nesse casamento de
conveniência, houve amor, eles se
apaixonaram! Sebastião, por todos esses fatores, foi um rei muito
desejado, desde o nascimento.
CICLOS
A história sempre se repete, mas
de outras formas. Este pode ser,
sim, um grande tema em meus filmes. A história lá atrás fala muito
sobre a história aqui na frente. O
muçulmano era um inimigo e havia um esforço para banir aquela
crença. Agora, passados centenas
de anos, aparecem os árabes a requerer, a lutar, a se manifestar. E
exatamente contra o mundo ocidental, que não tem mais aquela
força de crença. Na Europa, propaga-se um certo ateísmo e os
árabes conservam o vigor de sua
religiosidade. Vem com a idéia da
pureza de seus valores contra um
mundo ocidental decadente.
É o Quinto Império, ontem como hoje. É um ciclo, um eterno
retorno, no sentido histórico. Padre Antônio Vieira dizia, em uma
forte época cristã: "Um só papa,
um só rei". Todas as lutas foram
cultivadas por questões religiosas
ou pela ambição dos reis, e o
Quinto Império é isso, se reedita.
Está representado, por exemplo,
por imagens e instituições como
ONU ou na idéia da União Européia, com um só país, uma só democracia. Ou seja, o fim de "Um
Filme Falado", na explosão de um
cruzeiro pela ação de uma bomba
colocada por algum fundamentalista, pode estar próximo de "O
Quinto Império - Ontem como
Hoje", no sentido histórico. As faces apenas se inverteram.
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