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CINEMA - ESTRÉIA
Everett parece um personagem do século 19
GÉRARD LEFORT
do "Libération"
No cartaz do filme "Um Marido
Ideal", de Oliver Parker, Rupert
Everett está perfeito: moreno, bonito, vestindo smoking com uma
flor vermelha na lapela, a firmeza
do queixo e da boca formando
um contraste com a expressão
maliciosa de seus olhos escuros,
como se pensamento e emoção
fossem mantidos separados, cada
um em sua esfera própria, por
uma intervenção da vontade.
Resultado: quando encontramos esse homem ideal à nossa
frente, em carne e osso, tememos
que não seja tão perfeito assim.
Ou seja: que Rupert Everett em
pessoa não esteja à altura de lorde
Arthur Goring, herói da peça
mundana que Oscar Wilde escreveu em 1893 e que virou filme cem
anos mais tarde. Mas, bastam alguns segundos em sua companhia, para que esse temor se dissipe. Everett dá a impressão de ter
sido teletransportado diretamente da aristocracia londrina do final do século 19, tão cara ao humor de Wilde.
Vale notar que Everett teria integrado uma categoria própria: a
do pensador libertino. O tipo de
rapaz que seria capaz de desculpar-se (e, aliás, já o fez) por ser sério, e, ao mesmo tempo, ter a elegância de fazer você acreditar que
é mais perspicaz do que ele.
Everett é elegante, a ponto de
dar a impressão de estar dizendo
que a moda é o que ele veste. É um
verdadeiro dândi ao estilo Wilde,
mais Dorian Gray (que já representou no teatro) do que lorde
Goring, já que encarna a verdade
de que a juventude não é um estado (ele tem 40 anos), mas uma arte.
Diante de tal paradoxo encarnado em homem, a boa educação
exige que falemos de outra coisa
senão aquilo a que viemos. Por
exemplo: de James Bond, em cuja
pele é fácil imaginá-lo. A sugestão, apesar de não ter sido feita
com esse intuito, vem a calhar.
Após seu fenomenal sucesso ao
lado de Julia Roberts em "O Casamento de meu Melhor Amigo"
(1996), Rupert Everett teve algumas idéias divertidas para um roteiro de James Bond que teria como título "P.S.: I Love You" e seria
a história de um Bond homossexual. "Afinal", diz Everett, "é inconcebível que alguém de temperamento tão empreendedor
quanto James Bond não faça de
tudo: mulheres, é claro, mas homens também."
Essa deixa lhe permite começar
a falar de homossexualismo, a começar pelo homossexualismo
que acredita estar subjacente em
"Um Marido Ideal". "A homossexualidade escondida de um dos
personagens teria sido uma peripécia inútil. O que interessava a
Wilde era mostrar como um herói político pode ser pervertido
pela mentira e a ambição. A meu
ver, é mais interessante do que
sua possível homossexualidade."
Já a homossexualidade do próprio ator pode ser discutida livremente -ele nunca fez segredo
disso. Em entrevista que concedeu em 1992, o ator revelou que,
tendo chegado a Londres aos 15
anos de idade para estudar teatro,
passou a vender seu corpo de maneira esporádica.
Num Reino Unido majoritariamente inglês e anglicano, a família
Everett, apesar de ser burguesa
(pai oficial, mãe dona-de-casa) se
destacava por ser escocesa e católica. E, para reforçar esse aspecto
minoritário, o jovem Rupert fez
seus estudos num mosteiro beneditino. Mas, como manifestamente prefere a vida sonhada, fez dessa herança familiar o tema de um
de seus livros, "Hello Darling",
autobiografia que lhe foi encomendada por um editor quando
tinha 26 anos e da qual fez uma
colagem de verdades e mentiras:
"Aos 8 anos eu já sabia que jamais
seria uma grande atriz".
Quanto a seu outro romance,
"Le Coiffeur de Saint-Tropez"
(inédito na França), Everett o descreve como o retrato de um universo de dissipados que podem
encontrar-se, da noite para o dia,
na rua, sozinhos e arruinados. Se
ele vive como um desses personagens? "Com certeza. Mas, agora
que tenho um pé em Hollywood,
pretendo aproveitar o fato, mesmo sabendo que não posso esperar grande coisa disso. Em Hollywood, os melhores papéis sempre
são reservados aos atores de
maior sucesso. Como fiz sucesso
num papel gay, já me ofereceram
dezenas de outros, e assim será
até que todo o mundo se canse-
eu mesmo em primeiro lugar."
O que ele gostaria de fazer? "Um
pequeno filme ao estilo de Truffaut, romântico e destrutivo, em
que eu passasse o dia todo transando com Béatrice Dalle". E por
que não um personagem burlesco? "Você me superestima. Já estou dando o máximo de mim em
matéria de humor. Se tentasse fazer mais, me tornaria sinistro."
Tradução Clara Allain
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