São Paulo, sexta-feira, 04 de março de 2011

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Frágil ministério

Polêmica com Emir Sader e cabo de guerra em torno da reforma na Lei do Direito Autoral preocupam o Planalto; assessores da presidente Dilma pedem que ministra Ana de Hollanda neutralize opositores e mostre "agenda positiva"

ANA PAULA SOUSA
DE SÃO PAULO

O recado do Palácio do Planalto é claro: o MinC (Ministério da Cultura) precisa, com urgência, desvencilhar-se da "agenda negativa".
Num governo norteado pelo mantra da "agenda positiva" e pelo velho ditado que diz que "o peixe morre pela boca", a pasta comandada por Ana de Hollanda tem aparecido como exceção.
A despeito de ter um dos menores orçamentos da Esplanada, é um dos que mais tem aparecido na mídia. Não raro, metido em confusão.
Fontes ouvidas pela Folha confirmam que a exposição já causa desconforto no Planalto. Esta semana, a presidente Dilma Rousseff teria comentado, com interlocutores, que Hollanda precisa aprender a neutralizar os movimentos de oposição -venham eles do setor cultural ou do próprio ministério.
E se a presidente passou a se preocupar é porque, esta semana, a crise na cultura virou uma crise de governo.

O CASO EMIR SADER
Após entrevista publicada pela Folha em que o sociólogo Emir Sader, que deveria assumir a Casa de Rui Barbosa, chamou Hollanda de "meio autista", a ministra decidiu cancelar sua nomeação para o cargo.
Enfrentou, porém, resistências junto ao setor cultural do PT, que se sentia representado na pasta por Sader.
Numa tentativa de apaziguar o partido, foi escolhido, para seu lugar, o cientista político carioca Wanderley Guilherme dos Santos, ideologicamente próximo a Sader e ligado à diretoria do PT.
"Há setores do PT muito descontentes com a ministra", diz o cientista político Giuseppe Cocco, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. "Esse ministério é o grande erro do governo Dilma. É inexplicável a ruptura feita com a gestão anterior."
A sensação de ruptura, negada pela ministra, que prefere a expressão "continuidade", tem origem, sobretudo, na discussão sobre a reforma na Lei do Direito Autoral, proposta por Juca Ferreira, ministro do governo Lula.
A reforma da lei, um assunto explosivo e complexo, tornou-se o tema central da nova gestão. "Parte do setor cultural tem reagido com ansiedade", diz o secretário-executivo do Ministério, Vitor Ortiz. "Não se pode demonizar a discussão. O debate não foi finalizado ainda."

O DIREITO AUTORAL
O que está em jogo, nesse caso, é a flexibilização do tradicional "copyright", que, segundo alguns criadores e consumidores, já não cabe no mundo atual, marcado pelos avanços tecnológicos.
"É lamentável que uma discussão que foi pautada pelo debate público possa vir a ser concluída a portas fechadas, com a participação direta de pessoas ligadas ao Ecad, órgão que nem sempre se alinha aos interesses dos autores", diz o músico Dudu Falcão. O Ecad é o órgão que recolhe os direitos autorais.
O produtor de cinema Luiz Carlos Barreto, por sua vez, diz que a ministra, ao propor um recuo na revisão da reforma, está agindo com "prudência e sabedoria".
"Essa consulta pública só ouviu os músicos", diz Barreto. "A indústria cultural é muito maior que isso. A ministra está preservando o Brasil de um vexame. A reforma que tinham proposta não tinha pé nem cabeça."
Esta semana, o técnico que cuidava desse assunto no ministério, Marcos Souza, foi trocado por Márcia Regina Barbosa, servidora da Advocacia Geral da União (AGU).
"É natural que a ministra monte uma nova equipe. Ela tem que ter liberdade para escolher quem quiser", diz o secretário-executivo. "É preciso dar um tempo para que as coisas se acomodem. São só 60 dias de gestão. No centésimo dia, ela vai apresentar um plano de metas."

VOTO DE CONFIANÇA
O tom do "ainda é cedo" é adotado também por quem fazia oposição a Juca Ferreira e a Gilberto Gil. "Tenho restrições à postura acuada da ministra, mas temos que dar um voto de confiança", diz o ator Odilon Wagner, opositor dos antigos ministros.
Wagner teme, por exemplo, que Hollanda não tenha força suficiente para fazer com que a nova Lei Rouanet, em trâmite no Congresso, seja efetivamente votada.
O artista plástico Waltércio Caldas é outro que prefere trabalhar com a dúvida: "Há muitas fragilidades. Só não sei até que ponto são problemas que ela herdou ou problemas que está criando".


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