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CRÍTICA
Tom Zé derruba as barreiras da lógica musical em seu show
RONALDO EVANGELISTA
COLABORADOR PARA A FOLHA
Classificado como uma
"opereta" por seu autor, o
novo disco de Tom Zé, "Estudando o Pagode", já nasceu com certa
inclinação teatral. No texto do caprichado encarte do CD, inspirado em libretos de ópera, cada canção vem com sua letra acompanhada de especificações sobre
personagens, cenas e atos. Muitas
possibilidades abertas para a
transposição do disco para o palco, portanto. E, realmente, com
todo um "mise-en-scène" para a
apresentação de cada música, o
que temos são músicos/atores literalmente interpretando as canções. E Tom Zé, catalisador frenético de idéias, vestido de mendigo,
sambando, rindo, dançando, derrubando o microfone, enfiando o
dedo no nariz, se fazendo de bobo
e conquistando o público.
Tomando como ponto de partida e inspiração o tema da segregação da mulher, a força do feminino e o preconceito contra o pagode, o compositor vai além e mistura religião, história, filosofia,
Platão, Sócrates, o preconceito, o
rock, a bossa nova, "Roliúde",
Adoniran Barbosa, os méritos das
estradas de ferro e o que mais surgir, em um fluxo de consciência
que derruba todas as barreiras da
lógica tradicional, inclusive musicalmente. Com instrumentos como guitarra, baixo elétrico, violão
de sete cordas, teclados com sons
de folhas de fícus, bateria, pandeiro e vozes masculinas e femininas,
Tom Zé se permite criar, deixando tudo fluir e achando o espaço,
a hora e o lugar de cada coisa. Nada é estático e tudo é permitido.
Intelectual e pop, Tom Zé seduz
o público com facilidade. A cada
gesto, todos se entregam, riem,
admiram. É o ponto culminante
de um momento em sua carreira
em que consegue encher um teatro, de um público que o entende
e se diverte com seu senso de humor, que o considera genial. Isso,
depois de muitos anos sendo o incompreendido, o esquecido, o
"incomercial". E, se o caminho da
volta foi feito pelos gringos, que
primeiro lembraram da sua genialidade e o resgataram, é no
Brasil que Tom Zé pode ser ele
mesmo, que pode se apresentar e
cantar para um público que entende as suas referências e que fala
a sua língua. Um público que não
o vê como algo exótico e estrangeiro, mas simplesmente mais um
típico brasileiro excêntrico.
Tom Zé aprecia (e cultiva) uma
beleza mais bela, porque mais
feia. É o belo errado, sincero, humano, espontâneo, com senso de
humor. Sua música é doce, ainda
que esquisita. Sua sensibilidade é
feminina e as mulheres são grande parte do seu público. E agora
são grande parte de suas músicas,
na sua opereta. Na música de
Tom Zé, não há espaço para diferenças, limites, definições. Ele
desconstrói o que conhece, recria
novos conceitos e subverte tudo.
No palco, fala de si e explica suas
inspirações. O personagem se
mistura com o autor. O público
compartilha a experiência da
apresentação e se torna cúmplice.
Hoje, às 22h30, ele é entrevistado
no Roda Viva, da TV Cultura.
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