São Paulo, quinta-feira, 04 de agosto de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

COMIDA

A argentina Inés Berton lança no Brasil os chás que fascinaram o cantor Lenny Kravitz e o diretor Luc Besson

Chalosofia

CRISTIANE LEONEL
DA REPORTAGEM LOCAL

ALCINO LEITE NETO
EDITOR DE DOMINGO

O que há em comum entre o rei da Espanha, Juan Carlos 2º, o dalai-lama, o diretor Luc Besson, o cantor Lenny Kravitz e a "popstar" Shakira? Todos são fregueses da argentina Inés Berton, 32, considerada uma das principais especialistas em chá no mundo.
Para o rei, ela preparou no ano passado o chá Dom Quixote, misturado com frutas vermelhas. Para o dalai-lama, uma combinação com jasmim. Shakira adora aromas de especiarias. E Luc Besson pediu uma variação a partir de um raro chá branco.
Berton "desenha" e produz chás. Ela adquire as folhas no Oriente, combina-as com outros ingredientes e aromas e os transforma em produtos com nomes evocativos como Green Cornelia, Sophie, Royal Fruit -este um chá preto feito para o Brasil.
Berton veio a São Paulo para um evento que marca a criação de uma carta de chás para o restaurante D.O.M., de Alex Atala, que há muito era fã do trabalho da argentina e utiliza no seu estabelecimento os chás da marca Inti Zen, cujos blends foram elaborados por ela. Berton também veio divulgar sua marca, a Tealosophy (Chalosofia), cujos produtos devem chegar ao Brasil no final de setembro e estarão disponíveis em restaurantes e empórios de luxo. Apesar de a iniciativa de montar uma carta de chás ser bastante inovadora no Brasil, Berton já foi responsável pela elaboração de blends para restaurantes do mundo todo, inclusive o do famoso chef Ferran Adrià, o El Bulli.
Tealosophy é também o nome da loja de Berton em Buenos Aires, de um CD, de um livro de introdução ao chá e, embalando o conjunto, de uma idéia de cultura ligada à bebida. "A tealosophy é um pequeno luxo acessível", diz.
Por ter um "olfato absoluto", Berton pretendia estudar perfumaria. Foi para a França, matriculou-se numa escola de perfumes, mas, como detestava química, desistiu da carreira. Em Nova York, onde viveu oito anos, se envolveu com o estudo e a prática do chá.
Passou a aprender com mestres orientais e a visitar regularmente a China, o Japão, o Sri Lanka e a Índia. Nesses países se cultiva as melhores folhas da Camellia sinensis, a planta da qual se faz todos os chás e que está na origem do mundo variado e complexo da bebida, feito de numerosos sabores e aromas -uma cultura antiga e tão rica quanto a do vinho.
Berton tornou-se uma especialista de renome entre os cultores e fabricantes de chá, sendo solicitada por indústrias, restaurantes e celebridades. É citada como um dos "teanoses" (narizes para chá) mais sensíveis do planeta.
E o que ela acha dos "chás" brasileiros? Quando aproxima o nariz de um saquinho de "chá de cidreira", afasta-se como se tivesse levado um bofetão. "Não é chá, é uma infusão", diz. O mesmo se aplica ao que chamamos "chá de erva-doce", "chá de camomila" etc... Uma infusão não leva a preciosa Camellia: é feita da própria planta que lhe dá o nome.
De um chá preto famoso, ela corrige: "Não é um Orange Pecoe, como está escrito na caixa, mas um Fanning, mais barato". De um chá mate, elucida: "Não é um chá, não provém da Camellia, mas sim da planta mate".
Para a maioria dos brasileiros, o reino maravilhoso do chá é ainda uma terra a ser descoberta.

 

Folha - Como você "desenha", cria um chá?
Inés Berton -
Todo chá vem da mesma planta, a Camellia sinensis, que tem diferentes colheitas, conforme a região. Depois, às folhas dessa planta você acrescenta os ingredientes e os perfumes. Para o chá Vanilla Tiger, usei chá do Sri Lanka, baunilha de Madagascar e cacau da Venezuela. O chá que eu fiz para o Brasil, Royal Fruit, é uma colheita de chá preto também do Sri Lanka, misturado com aroma de manga e papaia e com pétalas de hibiscos.

Folha - É pecado usar açúcar, mel ou leite no chá?
Berton -
O grande pecado é o adoçante, que é muito metálico. Quanto ao leite, há alguns chás que o suportam, mas nunca o chá verde. Na Índia se toma o Indian Market com muito açúcar e leite de cabra. É fantástico. O English Breakfast pode ficar bem com açúcar. É melhor experimentar o chá e verificar se ele realmente precisa. Muitos já contêm elementos doces, como mel. Eu prefiro tomar sem açúcar.

Folha - O que acha do chá gelado?
Berton -
Eu adoro. Mas é preciso saber fazê-lo. Há uma maneira impecável: você deixa o chá esfriar na temperatura ambiente, num jarro, e coloca metade do líquido numa forma de gelo. Quando os cubos estiverem congelados, vocês os despeja na outra metade de chá (líquido) que deixou no jarro esperando.

Folha - Por que o café superou o chá no gosto popular do Ocidente?
Berton -
Porque o café tem muito a ver com a nossa cultura, com sua correria e sua exaltação. No Oriente, é preciso estudar seis anos para a cerimônia do chá. É um outro ritmo.

Folha - No Oriente, o chá está associado há séculos a uma filosofia de vida. O que significa "filosofia do chá", como você diz, nesta época de supervelocidade?
Berton -
A Tealosophy é um pequeno luxo acessível. O que eu pretendo é fundir duas culturas, a ocidental e a oriental, e criar um tempo de puro desfrute na vida estressante, uma pausa. O chá é isso: o tempo de colocar uma água para ferver, de escolher uma xícara, de selecionar as folhas que vai usar... É um desfrute intelectual deste luxo que é o tempo.


ONDE COMPRAR
Os chás de Inés Berton são vendidos em Buenos Aires na loja Tealosophy (av. Alvear, 1.883, tel. 00/xx/54/11/4808-0483). Cada lata custa em média R$ 20. No Brasil, os chás serão vendidos no D.O.M. (r. Barão de Capanema, 549, tel. 0/xx/11/ 3088-0761). Preços a definir. Os chás da Inti Zen são vendidos na Casa Santa Luzia (al. Lorena, 1.471, tel. 0/xx/11/3897-5000) por R$ 14,40 (caixa c/ 15 sachês)


Texto Anterior: Moda: Morre estilista que criava para Broadway
Próximo Texto: Bebida surgiu em solo chinês e por acidente
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.