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COMIDA
curtir, confitar, conservar
Antiga técnica de conservação de alimentos em gordura animal resiste ao tempo
e dá origem a variantes, como peixes, verduras e legumes preservados em azeite
JANAINA FIDALGO
DA REPORTAGEM LOCAL
Em cima do forno a lenha, finas mantas de carne defumavam estendidas num varal. Do
porco, abatido no dia, nada se
perdia. As duas bandas, picadas
em pedaços pequenos, fritavam
em sua própria gordura por horas, até não restar um vestígio
de água. Numa lata grande, hermeticamente fechada, a carne
se mantinha incólume, por meses, mergulhada em gordura.
As técnicas de conservação,
descritas por Maria Lúcia Clementino Nunes, a Dona Lucinha, dona do restaurante homônimo, remetem a um tempo
em que não havia energia elétrica, tampouco geladeira.
Hoje, mais que um jeito de
preservar os alimentos, as carnes de lata, os confits (em gordura animal ou azeite), as conservas (em sal, açúcar, bebidas
alcóolicas ou ácidos...) têm, sobretudo, uma função gustativa.
"As conservas nasceram da
necessidade de preservação e
evoluíram. Passaram a ficar
mais gostosas, foram virando
outra coisa e se incorporando à
nossa alimentação pelo prazer,
pelo gosto que proporcionam",
diz o chef Carlos Siffert. "Dá para fazer conserva com quase tudo, algumas com mais sucesso,
e as combinações são infinitas."
Técnica eficaz
O pulo-do-gato, o segredo comum a quase todos os tipos de
conserva, é eliminar a água do
alimento. Quanto mais seco estiver, menor o risco de estragar.
"A água é a grande vilã, compromete o alimento porque é
condutora de bactérias. Nos
processos de conserva, em banha ou até na carne-seca, o objetivo é extrair o líquido", explica a chef Mara Salles.
No Tordesilhas, Mara faz um
confit bem brasileiro (ripa de
costelinha de porco na lata) para acompanhar o tutu e um
bem francês (de pato) para colocar no tucupi. "Minha mãe
era chique e não sabia. Cinquenta anos atrás ela já fazia
confit", diz. "A técnica da carne
de lata nós certamente aprendemos com os portugueses.
Mais que fazer um resgate, ou
manter a tradição, funciona como um instrumento técnico
extremamente eficaz. Para fazer uma costelinha de porco
boa, leva-se algumas horas. Se
deixar na geladeira, fica seca, o
que não acontece na gordura."
Confits modernos
Nem só de carnes cozidas
longamente em sua própria
gordura vivem os confits.
Atualmente, há uma série de
variantes com peixes, verduras
e legumes confitados em azeite.
No pastifício e rotisseria Mesa III, a chef Ana Soares tem
uma extensa linha de confitados: de salmão e tomate,
passando por alho e cogumelo.
Tudo pronto para levar para
casa e brincar de cozinhar com
meio caminho andado.
"Além de conservar, esse método amplia as possibilidades e
facilita a vida. Um peixe, por
exemplo, vai bem puro, numa
salada ou misturado com uma
ricota. Você tira da geladeira e
usa, como se abrisse uma latinha, só que com mais sabor."
Diferentemente das carnes,
Ana explica que os peixes são
muito mais rápidos. "Não pode
perder o tempo, não pode fritar. A temperatura tem de ser
bem baixa. Uma sardinha fica
pronta em dois minutinhos."
As frutas também têm sido
alvo das experimentações da
chef. A idéia é conservá-las no
açúcar, mas recorrendo principalmente à doçura natural de
cajus, kinkans e jabuticabas.
"Usamos açúcar demais. A
idéia é fazer uma calda bem leve e manter o frescor da fruta."
CARLOS SIFFERT
Onde: tel. 0/xx/11/3868-2508
MESA III
Onde: r. Alves Guimarães, 1.464, Pinheiros, tel. 0/xx/11/3672-2130
TORDESILHAS
Onde: r. Bela Cintra, 465, Cerqueira César, tel. 0/xx/11/3107-7444
NA INTERNET
www.folha.com.br/082472
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