São Paulo, quinta-feira, 04 de setembro de 2008

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COMIDA

curtir, confitar, conservar

Antiga técnica de conservação de alimentos em gordura animal resiste ao tempo e dá origem a variantes, como peixes, verduras e legumes preservados em azeite

JANAINA FIDALGO
DA REPORTAGEM LOCAL

Em cima do forno a lenha, finas mantas de carne defumavam estendidas num varal. Do porco, abatido no dia, nada se perdia. As duas bandas, picadas em pedaços pequenos, fritavam em sua própria gordura por horas, até não restar um vestígio de água. Numa lata grande, hermeticamente fechada, a carne se mantinha incólume, por meses, mergulhada em gordura. As técnicas de conservação, descritas por Maria Lúcia Clementino Nunes, a Dona Lucinha, dona do restaurante homônimo, remetem a um tempo em que não havia energia elétrica, tampouco geladeira. Hoje, mais que um jeito de preservar os alimentos, as carnes de lata, os confits (em gordura animal ou azeite), as conservas (em sal, açúcar, bebidas alcóolicas ou ácidos...) têm, sobretudo, uma função gustativa. "As conservas nasceram da necessidade de preservação e evoluíram. Passaram a ficar mais gostosas, foram virando outra coisa e se incorporando à nossa alimentação pelo prazer, pelo gosto que proporcionam", diz o chef Carlos Siffert. "Dá para fazer conserva com quase tudo, algumas com mais sucesso, e as combinações são infinitas."

Técnica eficaz O pulo-do-gato, o segredo comum a quase todos os tipos de conserva, é eliminar a água do alimento. Quanto mais seco estiver, menor o risco de estragar. "A água é a grande vilã, compromete o alimento porque é condutora de bactérias. Nos processos de conserva, em banha ou até na carne-seca, o objetivo é extrair o líquido", explica a chef Mara Salles. No Tordesilhas, Mara faz um confit bem brasileiro (ripa de costelinha de porco na lata) para acompanhar o tutu e um bem francês (de pato) para colocar no tucupi. "Minha mãe era chique e não sabia. Cinquenta anos atrás ela já fazia confit", diz. "A técnica da carne de lata nós certamente aprendemos com os portugueses. Mais que fazer um resgate, ou manter a tradição, funciona como um instrumento técnico extremamente eficaz. Para fazer uma costelinha de porco boa, leva-se algumas horas. Se deixar na geladeira, fica seca, o que não acontece na gordura."

Confits modernos
Nem só de carnes cozidas longamente em sua própria gordura vivem os confits. Atualmente, há uma série de variantes com peixes, verduras e legumes confitados em azeite. No pastifício e rotisseria Mesa III, a chef Ana Soares tem uma extensa linha de confitados: de salmão e tomate, passando por alho e cogumelo. Tudo pronto para levar para casa e brincar de cozinhar com meio caminho andado. "Além de conservar, esse método amplia as possibilidades e facilita a vida. Um peixe, por exemplo, vai bem puro, numa salada ou misturado com uma ricota. Você tira da geladeira e usa, como se abrisse uma latinha, só que com mais sabor." Diferentemente das carnes, Ana explica que os peixes são muito mais rápidos. "Não pode perder o tempo, não pode fritar. A temperatura tem de ser bem baixa. Uma sardinha fica pronta em dois minutinhos." As frutas também têm sido alvo das experimentações da chef. A idéia é conservá-las no açúcar, mas recorrendo principalmente à doçura natural de cajus, kinkans e jabuticabas. "Usamos açúcar demais. A idéia é fazer uma calda bem leve e manter o frescor da fruta."

CARLOS SIFFERT
Onde: tel. 0/xx/11/3868-2508

MESA III
Onde: r. Alves Guimarães, 1.464, Pinheiros, tel. 0/xx/11/3672-2130

TORDESILHAS
Onde: r. Bela Cintra, 465, Cerqueira César, tel. 0/xx/11/3107-7444

NA INTERNET
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