São Paulo, domingo, 04 de setembro de 2011

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CRÍTICA DOCUMENTÁRIO

Globo admite 'pecados' em obra sobre fundador

'Roberto Marinho - O Senhor do Seu Tempo' comenta erros da empresa nas Diretas-Já e na eleição presidencial de 1989

MAURICIO STYCER
ESPECIAL PARA A FOLHA


A CAMPANHA DAS DIRETAS-JÁ, EM 84, É TEMA DE VÁRIOS DEPOIMENTOS. PARA O EDITORIALISTA LUIZ GARCIA HOUVE "FALTA DE SENSIBILIDADE"


Mais recente título de uma série intitulada "Grandes Brasileiros", o documentário "Roberto Marinho - O Senhor do seu Tempo" não apresenta novidades significativas sobre o seu personagem, mas reforça um movimento recente das Organizações Globo de discutir em público alguns dos "pecados" que celebrizaram os veículos do grupo.
Produzido pela FBL, criada por Fernando Barbosa Lima (1933-2008) e hoje tocada por sua mulher, Rozane Braga, o filme começa com o passeio da câmera pelo casarão no Cosme Velho onde o empresário viveu por décadas, até chegar ao quarto dele, onde se encontra Edgar Peixoto, o mordomo que o serviu por anos a fio.
A sugestão desses primeiros planos -um mergulho na intimidade de Roberto Marinho (1904-2003)- não passa disso mesmo. Uma sugestão.
De forma didática, mas pouco imaginativa e sem profundidade, o documentário descreve a trajetória de Marinho, tanto a pessoal quanto a empresarial, exclusivamente pela voz dos três filhos e de alguns de seus principais assessores e funcionários.
Há, de fato, algumas curiosidades, como a confirmação da lenda segundo a qual Roberto Marinho nunca cogitou morrer. "Se um dia eu vier a faltar", ele dizia. Também é engraçado saber que o empresário raramente falava palavrões e quando o fazia era em francês.
Mas o foco é outro. Como as Organizações Globo já haviam feito em outros documentos e livros, alguns depoimentos tratam abertamente de famosos erros cometidos ao longo da história pelo jornal e pela TV dos Marinho.
As melhores intervenções são do jornalista Claudio Mello e Sousa, ex-assessor de Marinho. O suicídio de Getúlio Vargas, em 1954, e o apedrejamento de "O Globo" em protesto contra a posição antigetulista do jornal, ensinaram uma coisa ao empresário: "A gente tem que apoiar os governos. Qualquer governo", conta Mello e Souza, com um sorriso maroto.

SENSIBILIDADE
A campanha das Diretas-Já, em 1984, cujos primeiros comícios não mereceram destaque do grupo, é tema de vários depoimentos. O editorialista Luiz Garcia fala em "falta de sensibilidade".
José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, diz que Roberto Marinho temia "uma retomada da revolução comunista prevista antes da chamada Redentora [o golpe militar de 1964]". Mello e Souza, que morreu no último dia 11/8, aos 76 anos, é mais direto: "Houve um erro, uma bobeira geral nos dois órgãos [jornal e TV]".
Antes de lembrar do chamado "escândalo Proconsult", ocorrido nas eleições de 1982, percebido por Leonel Brizola (1922-2004) como uma tentativa de fraudar a sua eleição ao governo do Rio, Mello e Souza dá a entender que havia um índex com nomes proibidos no noticiário da casa. "Brizola foi um dos frequentadores da Sibéria do doutor Roberto", diz.
A edição do debate entre Collor e Lula, na véspera da eleição presidencial em 1989, é longamente abordado.
Mello e Souza diz: "Tenho praticamente certeza de que a candidatura Collor nasceu num dos sofás da sala do Roberto Marinho na TV".
João Roberto Marinho afirma que o pai "tinha simpatia pelo Covas" e que "jamais houve uma orientação" para que os veículos do grupo apoiassem Collor na eleição. Ao falar do famoso debate, no entanto, João Roberto observa: "Nós erramos. Erramos com a intenção de acertar".
Segundo Boni, a percepção na Globo é que Collor venceu o debate contra Lula, mas Roberto Marinho entendeu que a primeira edição do encontro, exibida no "Jornal Hoje", não expressava isso. "E mandou reeditar esse debate."
Boni cita Armando Nogueira (1927-2010), então diretor de jornalismo, que teria dito: "Collor ganhou o debate por 3 a 2. O doutor Roberto mandou editar de 3 a 0". MAURICIO STYCER é repórter e crítico do portal UOL.

ROBERTO MARINHO - O SENHOR DO SEU TEMPO
DISTRIBUIÇÃO
FBL
QUANTO R$ 34,90
CLASSIFICAÇÃO não informada
AVALIAÇÃO regular



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