Mesmo com ótimos atores, "O Amor e Outros Estranhos Rumores" se apequena por apenas evocar universo de contos do autor

LUIZ FERNANDO RAMOS
CRÍTICO DA FOLHA

Um labirinto sem porta de saída. "O Amor e Outros Estranhos Rumores", espetáculo do Grupo 3 de Teatro, traz à cena a literatura de Murilo Rubião (1916-1991). Apesar do capricho, a produção não concretiza em teatro a rara estranheza dos textos do escritor mineiro.
Rubião é um autor singular. Antecipou, nos anos 40, uma escrita que agregava ao realismo de situações cotidianas elementos mágicos e reescreveu durante toda a vida as 33 histórias curtas que integram sua sucinta obra.
A diretora Yara de Novaes serviu-se da adaptação de Silvia Gomez de três contos: "Bárbara", "Três Nomes de Godofredo" e "Memórias do Contabilista Pedro Inácio". O que amarra as narrativas é uma situação transitória: três personagens se perguntam sobre os destinos das viagens que cada um almeja fazer. As passagens que portam estão em branco e só um quarto personagem, com cabeça de coelho, teria a resposta.
Configuram-se aí dois traços recorrentes da obra de Rubião: a metamorfose de humanos em animais e a indefinição desses seres híbridos. Soma-se a isso o cenário de André Cortez, com amplas paredes laterais cheias de portas e janelas em que as saídas transportam a novos interiores.
Mas, quando as três histórias eleitas põem-se a funcionar, parece que a encenação se apequena, colocando-se a serviço da dimensão literária e renunciando a transformar-se em vero drama. A força intrínseca dos contos se dilui e não se atinge um parâmetro teatral próprio.
Verdade que os atores são ótimos, principalmente a talentosa Débora Falabella, e que todo o tratamento de figurinos e máscaras é virtuoso. Mas esses esforços não resultam na intensidade que a literatura de Rubião por si mesma enseja.
O espetáculo enfim se justifica, mas sem romper a armadilha em que se vê apanhado. Simplesmente evocar o estranho mundo de Rubião não o materializa. Caberia, talvez, encená-lo para além de seus próprios termos.