São Paulo, #!L#Sábado, 05 de Fevereiro de 2000


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HISTÓRIA
Livro acima das modas

MARCELO PEN
especial para a Folha


A julgarmos pelo sucesso dos livros de Eduardo Bueno, há muitas semanas nas listas dos mais vendidos, a história está na moda.
Embalada pelos festejos relacionados ao descobrimento e impulsionada pela onda de biografias e romances históricos, a disciplina granjeia novos admiradores e recebe uma saudável injeção de capital das editoras.
Isso, em parte, explica a edição ilustrada, enriquecida de vários mapas antigos coloridos, de "História de um País Inexistente - O Pantanal entre os Séculos 16 e 18", da professora mato-grossense Maria de Fátima Costa.
Costa procura contar a história da maior área alagada do mundo, descoberta pelos espanhóis e posteriormente batizada pelos portugueses de Pantanal.
Partindo dos relatos de exploradores e colonizadores, ela descortina uma paisagem paradisíaca e intrigante, ao mesmo tempo ameaçadora, rica e evanescente.
Em vez de se preocupar com as verdades históricas, Costa se concentra em examinar os relatos dos conquistadores. Capta, assim, a imagem que os europeus faziam da região do Alto Rio Paraguai e de seus habitantes autóctones, até que a delimitação das fronteiras sufocasse o mito.
Essa imagem incorpora "seres maravilhosos, paraísos encantados e cidades fabulosas". Abrange os índios xarayes e guaikurús, os senhores daquelas terras. Abriga a mística das copiosas jazidas de ouro e prata, que, de fato, encontravam-se mais além, no Peru. Encerra "notícias" de batalhas, mortes, antropofagia indígena e cristã, traições e atos de heroísmo.
Ou tanto por seu conteúdo como por sua forma, os relatos se assemelham "ao tom dramático dos viajantes medievais".
Nos depoimentos, a região surge como a "fabulosa Laguna de los Xarayes". Esse espaço sujeito "ao ritmo das águas" cria uma "paisagem migratória, uma geografia mutável", que aguça a imaginação. Depois de dois séculos, a imagem castelhana da Lagoa será eclipsada pela do Pantanal, "uma invenção luso-brasileira".
Trata-se de uma obra de fôlego, que recorre a inúmeras fontes manuscritas, impressas e cartográficas, algumas bastante raras. O cotejo é rigoroso; as análises, precisas; o conjunto, empolgante. Costa sabe conduzir suas informações de um modo saboroso e articulado, que envolve o leitor.
Numa mescla de erudição, prosa límpida e estilo envolvente, a autora realiza uma formidável cartografia do mito de uma terra imponderável, ainda mais visitada que habitada, mais sonhada que vivida. O resultado é um livro acima das modas.


Avaliação:    


Livro: História de um País Inexistente - O Pantanal entre os Séculos 16 e 18 Autor: Maria de Fátima Costa Editora: Estação Liberdade / Kosmos Quanto: R$ 34 (280 págs.)

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