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MEMÓRIA/"RAJADAS DA HISTÓRIA"
Militar russo conta trajetória da AK-47
RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL
Há duas maneiras de ler "Rajadas da História - O Fuzil
AK-47 da Rússia de Stálin até Hoje", o livro do projetista de armas
russo Mikhail Kalachnikov. Há o
aspecto técnico, que conta a história da mais famosa arma de fogo
da última metade de século. E há a
vida do projetista, que resume
bem as vicissitudes pelas quais
passaram os russos depois da revolução bolchevique de 1917, da
luta com os alemães e dos embates ideológicos do pós-guerra até
o fim do comunismo.
A arma dispensa apresentações;
está nos noticiários da imprensa
internacional todo dia. Os fuzis
automáticos da série AK -sigla
em russo para "Avtomat Kalachnikova"- foram produzidos aos
milhões. O primeiro modelo, AK-47, como a sigla informa, é de
1947. Depois vieram AKM, AKS,
AK-74 etc, que equiparam os
exércitos do mundo comunista,
tanto do Pacto de Varsóvia como
da China e satélites, além de terem
sido usados por praticamente todos os grupos guerrilheiros e terroristas do pós-guerra.
A arma virou até emblema em
bandeira nacional. A bandeira da
União Soviética tinha uma foice e
um martelo; a de Moçambique,
ex-colônia portuguesa tornada
independente por um grupo
guerrilheiro marxista, traz uma
AK-47 e uma enxada. Kalachnikov narrou sua vida à jornalista
francesa Elena Joly, que antes de
cada capítulo, faz um bom resumo da história soviética, colocando em contexto a vida do ex-sargento que se tornou general e deputado no Soviete Supremo.
O inventor não teve uma vida
fácil antes de criar uma das marcas mais famosas do século 20.
Sua família foi deportada para a
Sibéria nos anos 30, e ele foi ferido
em combate na titânica luta entre
alemães e soviéticos na frente
oriental de 1941 a 1945.
Kalachnikov conta em detalhe
sua filosofia de projeto, seu desejo
de criar uma arma poderosa para
defender sua pátria. "Espero que
eu permaneça na memória das
pessoas como aquele que criou
uma arma para defender as fronteiras de seu país, e não a arma
dos terroristas", diz ele.
"Quem lhe dera!", replica a própria co-autora em seguida. Os
russos nunca precisaram usar as
AK para defender seu país. A arma foi usada para atacar outros
-como o Afeganistão da década
de 80. Guerrilheiros afegãos usaram AKs capturadas contra os
próprios russos.
Ele relata quais as influências de
projeto que teve, tanto russas como estrangeiras, como o fuzil
americano Garand. Mas não dá o
devido mérito aos alemães, que
produziram fuzis automáticos
antes dele e os usaram com sucesso na guerra. Comentando o AK-47, o historiador britânico John
Weeks resume: "Seu enorme sucesso é na verdade um tributo distante e tardio à pequena equipe
alemã que formulou suas idéias
em 1938". Como os alemães tentaram mais de uma vez matar Mikhail Timofeievitch Kalachnikov,
até dá pra entender a reticência
em lhes dar algum crédito.
Rajadas da História
Autores: Mikhail Kalachnikov/Elena Joly
Editora: Jorge Zahar
Quanto: R$ 35 (176 págs.)
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