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TEATRO
Autor Lauro César Muniz lança em junho comédia que discute homossexualismo, pedofilia e sincretismo na igreja
Padre abusa de garoto em "O Santo Parto"
MARCELO RUBENS PAIVA
ARTICULISTA DA FOLHA
Tem cheiro de polêmica no ar. E
das fortes: pedofilia, anacronismo
da igreja, sincretismo, escravidão
e um jovem padre, José, que abusa sexualmente de um menino de
15 anos, um metaleiro evangélico,
numa noitada de chá de cogumelo, e fica grávido. Sim, grávido.
Um cardeal de 250 anos, fundador do templo em que o padre
congrega, ressuscita para infernizá-lo. São Jorge aparece e sugere
fazer o parto com sua espada:
"Minha boa santa Paulina, talvez
eu não consiga abrir aquela barriga. Como parir sem vagina?".
Revela-se, depois, que são Jorge
é cover de Elvis. Essa é a trama da
comédia "O Santo Parto", do dramaturgo e autor de novelas Lauro
César Muniz, 66, que estréia no
dia 10 de junho, feriado de Corpus
Christi, no teatro do Leblon (Rio).
A peça é produzida por sua filha, Fernanda Muniz, 37. No elenco, José de Abreu, Roberto Bomtempo e Sérgio Maroni. A direção
ficará a cargo de Luiz Arthur Nunes ("Arlequim").
"Quando li, não acreditei e pensei: "Será que, com a idade, o Lauro César Muniz ficou maluco?'",
conta Abreu, ator que fará o cardeal de 250 anos.
"A peça vai mexer numa feridinha, naquela coisa arcaica da igreja, homossexualismo e drogas.
Vamos brincar de fazer teatro de
verdade, com uma peça que fala
de algo para valer", diz Fernanda.
"A data da estréia é uma coincidência, mas sabemos que provoca. Outra coincidência: o espetáculo demorou nove meses para
fechar o elenco."
O custo da produção é de R$ 250
mil. "Ligamos para várias empresas, mas não fechamos nenhum
patrocínio. A equipe está topando
fazer por um custo mais baixo",
completa Fernanda.
"O Santo Parto" começa com o
padre em trabalho de parto na sacristia de uma igreja, após rezar
uma missa. Ele fala pelo telefone:
"Pedi que viesse à missa, você não
veio. Eu estou torturado pela dor.
Está bem grande, cada vez maior,
cresce, cresce e parece não parar
de crescer. Tem o tamanho maior
que uma abóbora. Eu disse que
precisava de você. Você me abandonou. Eu preciso de um médico.
Não! Não vou à Santa Casa!".
O autor é de família católica, freqüentou a igreja na infância, mas
nunca foi praticante. "Vai dividir.
Quanto aos católicos, acho que
haverá uma adesão, porque defende a igreja progressista, apesar
da forma fantástica. Fica clara
uma postura simpática à Teologia
da Libertação. Não espero unanimidade. Não tenho unanimidade
nem dentro de mim", diz Muniz.
Segundo o autor, houve um retrocesso grande a partir do papa
João Paulo 2º: "Deixa-me intrigado o anacronismo da igreja. Como um poder tão grande pode estar tão fora da realidade? Há um
descompasso entre o pensamento
da igreja e a realidade".
"Sempre me atraiu a igreja, mas
nada que me levasse à fé. Acho
que, depois da idade, a gente fica
mais corajoso. Está na hora de expor meu ponto de vista. Vou ter
muitos seguidores com essa peça." Depois de "O Santo Milagroso", sua peça de estréia em 1963, Muniz quis retomar a discussão de forma mais
contundente. Recentes denúncias
de pedofilia deram o empurrão de
que precisava.
O enredo surgiu quando ele
pensou no padre grávido. "Comecei a pesquisar o assunto, li muita
coisa a respeito do erotismo da
igreja. São Jorge faz uma ligação
com o sincretismo da umbanda, é
um dos santos mais venerados,
aquilo em que o povo acredita,
mas foi cassado. Ele é o padroeiro
de Madre Paulina, a primeira santa do Brasil", afirma.
E explica: "Do outro lado, o cardeal fundador daquela freguesia
representa o pensamento reacionário, ultraconservador, que, no
seu tempo, há 250 anos, tinha escravos negros e abusava sexualmente das escravas. E Elvis é a raiz
da música contemporânea".
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