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Na horta do sr. John
Em busca de brotos e flores comestíveis diferentes, produtor é reverenciado por chefs estrelados, com quem estabelece parcerias e desenvolve novos produtos
JANAINA FIDALGO
ENVIADA ESPECIAL A CERQUILHO
No mundo ideal, todo bom
restaurante teria, no fundo da
cozinha, uma horta. Dali, sairiam ervas e hortaliças fresquíssimas "à la minute".
No mundo possível, os brotos
e as flores comestíveis usados
por um seleto grupo de chefs
paulistanos vêm de uma horta
orgânica que fica atrás de uma
cozinha, a do carioca John Derek Orr, 64, administrador marítimo que há quase 12 anos
"vive de futuro", sempre pensando em como inovar.
O sr. John -assim chamado,
com reverência, por seus clientes estrelados (só chefs)- trocou a bem-sucedida carreira na
indústria de contêineres pelo
cultivo de ervas condimentares
depois de perder o filho, John
Robert, que plantava alface nas
estufas do antigo haras da família, em Cerquilho (146 km de
São Paulo). De lá, saem hoje as
ervas, flores e produtos asiáticos da DRO -iniciais da caçula,
Deborah, 22, que recentemente assumiu a empresa.
Depois das ervas, sr. John
percebeu que, se não quisesse
ser mais um no mercado, teria
de desenvolver produtos diferenciados. Passou a oferecer
"olho" (as primeiras quatro folhinhas) de manjericão, de hortelã. Depois, veio o "olho" com a
flor. E, mais adiante, teve a
idéia de cultivar brotos -o primeiro rebento da semente, colhido ainda bebê, de visual
atraente e sabor intenso.
"Antes de lançar os brotos,
levamos meses e meses. Erra,
conserta, muda a semente. Dá
um trabalhão danado, mas é
uma delícia", conta. "Não pode
ter uma folhinha rasgada, furada. Perfeito, para a gente, é ter
zero de defeito. O restaurante
tem uma responsabilidade
grande que começa aqui."
Na outra ponta, um de seus
clientes mais ilustres retribui:
"Meu trabalho aqui é não estragar o que o sr. John manda perfeito", diz Alex Atala, chef do
D.O.M. "O Brasil tem uma sorte
tremenda de ter um cara como
o sr. John. Se ele pedisse dez
vez mais, eu pagaria. Vários
chefs que cozinharam aqui, o
Pascal Barbot, a Anne-Sophie
Pic, o Alain Passard, ficaram
impressionados. Perguntam se
eu tenho uma horta privada."
Particulares as estufas da família Orr não são. Mas ali os
chefs recebem certos mimos,
como a exclusividade em alguns produtos novos por um
ano, tempo necessário para
adaptarem a produção e darem
fluxo ao cultivo. "Esse contato
com o produtor ainda não é tão
comum. Quem dera fosse", diz
José Barattino, chef do Emiliano, que tem exclusividade de
melissa e só um outro fornecedor-parceiro, o de patos, da Ville de Feurs. "É fantástico conversar e desenvolver coisas juntos. A transferência de qualidade para o prato é imediata."
Toda a produção de broto de
salsão e de flores de nirá, de mel
e de ruqueta (rúcula selvática)
hoje é vendida apenas ao Pomodori. "Graças a Deus [somos
exclusivistas]", brinca o chef
Jefferson Rueda. "Calêndula e
amor-perfeito todo mundo usa.
Eu queria flores de ervas. Fico
enchendo a cabeça da Deborah.
A gente tem que sair da rotina."
Foi assim, sob pressão, que
nasceu o broto de salsão. "O
Jeffinho falou umas 80 vezes
que queria porque queria. Já tínhamos testado uns 12 tipos de
semente, e nenhuma tinha dado certo. Levou quatro meses
para conseguirmos produzir.
Quando cheguei com o bendito
broto, ele quase morreu", brinca Deborah. "Tem chef que cobra coisa nova o tempo todo: "O
que mais você tem? Já faz um
mês que não traz nada novo!'"
Isso quando eles não resolvem ligar, tarde da noite, para
tirar dúvidas sobre uma flor comestível -linha que é a menina-dos-olhos do sr. John e que,
em breve, terá novidades. "O
subchef do Alex me ligou às dez
da noite querendo saber qual
era a flor de "cabelinho verde e
cheiro de queijo". Lá fui eu, de
lanterna, cheirar flor por flor.
Era a verbena. E não é que tem
cheiro de queijo mesmo?"
Em se plantando tudo dá
Quando bateu na porta do
D.O.M., há oito anos, o sr. John
ouviu um desafio: produzir coisas diferentes. "Ele aceitou, e
eu pedi muitas coisas. Na relação de troca, estou em vantagem. Entrego menos do que ele
me fornece", diz Atala.
Mas, das mãos do chef, os Orr
já receberam muda de ora-pro-nóbis e semente de jambu. De
Ina de Abreu, chef do Mestiço e
uma das clientes mais antigas,
ganharam semente de manjericão tailandês. Do Aizomê, veio
uma muda de mitsuba -um tipo de trevo japonês. "Eles não
só fornecem como dão liberdade de a gente trazer coisas para
cultivarem", diz Rueda. "É a
horta que eu não tenho no fundo do meu restaurante."
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