|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
MEMÓRIA
Considerado um dos maiores nomes do fotojornalismo, o francês tinha 95 anos; causa da morte não foi revelada
Morre na França Henri Cartier-Bresson
PATRICK ROEGIERS
DO "MONDE"
Henri Cartier-Bresson, um dos
grandes mestres da fotografia do
século 20, morreu na segunda-feira, aos 95 anos de idade, em Céreste (Alpes-de-Haute-Provence).
A informação foi dada por pessoas próximas ao fotógrafo, que
também informaram que seu corpo foi sepultado na quarta-feira.
A causa da morte não foi revelada.
Autor de uma obra grandiosa e
pai do fotojornalismo moderno,
um dos maiores fotógrafos contemporâneos, Henri Cartier-Bresson morreu em l'Isle-sur-la
Sorgue (Vaucluse). Acaba de chegar ao fim uma vida inteira passada percorrendo o mundo.
Dotado de curiosidade insaciável e mais paradoxal do que sua
obra parece indicar, Cartier-Bresson definiu sua relação com a fotografia nos seguintes termos:
"Para mim, a máquina fotográfica é uma verdadeira amante. Ela
nos dá vontade de encerrar o
mundo inteiro nessa caixinha,
com todos os detalhes significativos que fazem o encanto da existência". Cartier-Bresson, que só
se tornou repórter profissional
em 1946, dá a impressão de ter estado presente sempre. A maior
parte dos fatos marcantes do século foi registrada por seu olhar.
Nascido em 1908, em Chanteloup, perto de Paris, ele cresceu
num ambiente em que não faltava
dinheiro e estudou pintura com
André Lhote. Marcado pelos conceitos de André Breton sobre o
acaso, a revolta e a intuição, ele foi
primeiramente influenciado pelo
surrealismo. Foi por meio do fotojornalismo, que ele comparava
à instantaneidade do desenho,
que chegou à fotografia, nos anos
1930. Cartier-Bresson carregava a
máquina fotográfica como um
caderno de anotações e afirmava
ter encontrado seu senso de composição apenas três dias depois de
ter começado a usar sua Leica.
Em Nova York, ele se iniciou na
montagem fotográfica com Paul
Strand. Em 1937 casou-se com
Ratna Mohini, uma dançarina javanesa. Tornou-se assistente de
Jean Renoir em três de seus filmes. Feito prisioneiro de guerra
nos Vosges, em 1940, conseguiu
escapar. Aos 38 anos, entrou para
o mundo dos mitos com a homenagem póstuma que lhe foi feita
após a guerra pelo Museu de Arte
Moderna de Nova York, acreditando que tivesse morrido.
Por mais que rejeitasse o rótulo
de jornalista, Cartier-Bresson foi
uma das principais testemunhas
de todos os grandes acontecimentos mundiais, quer se tratasse da
libertação de Paris, ou, em 1949,
dos últimos dias do Kuomintang
em Pequim. Passou pela China,
por Cuba e pela Índia, onde esteve
com freqüência. Era talvez nesse
país que se sentisse melhor. Quer
mostrasse o último jejum de Gandhi, seu corpo no dia seguinte a
seu assassinato ou simples cenas
de pesca ou oração, o desprendimento, o fervor e a abstração que
marcam seu olhar são levados ao
auge nessas imagens indianas.
O que fascina, de fato, é que esse
olhar em nenhum momento perturba a ordem das coisas. Henri
Cartier-Bresson fotografa "como
um gato, sem incomodar". Suas
imagens impecáveis, tão clássicas
em sua forma, permanecem instantâneas porque são intrinsecamente ligadas ao prazer da tomada. Cartier-Bresson sabia que, em
todas as circunstâncias, "a vida só
se exprime de uma vez por todas".
Nada se deve ao acaso nessas visões enquadradas com maestria,
nas quais se combinam ao mesmo tempo a tensão, a graça e a
emoção. "O segredo é a concentração", disse. Tudo depende da
elasticidade do dedo. A tomada
fotográfica ou o prazer tátil e sensual da tomada, como ele explicou claramente em sua teoria do
""instante decisivo".
Cartier-Bresson contribuiu para dar nobreza à fotografia em um
momento em que ela era pouco
reconhecida. Como Kertész, que
ele sempre teve como mestre, ele
originou toda uma geração de fotógrafos que, no pós-guerra, se
sentiram em casa na rua.
Nos últimos anos, o culto a Cartier-Bresson vinha diminuindo.
O pai da fotografia era contestado
de vez em quando. A partir de
1973, passou a dedicar-se ao desenho, a lápis e a carvão. Apesar do
cuidado extremo que dedicou a
eles, esses desenhos jamais chegaram a ter o caráter de esboço instantâneo de suas fotos.
Em mais de meio século, igualando-se aos maiores, Cartier-Bresson criou uma obra imensa,
cujo alcance ele resumiu assim:
"Para compreender a história, é
preciso conservar uma certa forma de inocência. Meu único segredo foi tomar meu tempo e, sobretudo, tomar o tempo necessário para viver com as pessoas ... e,
depois, saber esquecer".
Tradução de Clara Allain
Texto Anterior: Música: Johnny Alf retorna ao palco com sua melodia sinuosa Próximo Texto: Repercussão Índice
|