São Paulo, sexta-feira, 05 de agosto de 2005

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CINEMA/"A ILHA"

Michael Bay copia "THX 1138" em longa sobre futuro pós-apocalíptico, mas abusa da violência banal

Ficção vulgariza filme de estréia de Lucas

THIAGO STIVALETTI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Em 1971, George Lucas fazia sua estréia na direção com "THX 1138", uma ficção científica de tema sombrio em que os personagens viviam em um sistema asséptico gerenciado pelo governo. Os pensamentos eram controlados, a liberdade era uma impossibilidade, e o amor, um crime.
O homem do título começa a ter crises existenciais e, com sua mulher, desafia o sistema. A distopia tinha claras influências de "Admirável Mundo Novo", de Huxley, e de "1984", de George Orwell.
Agora, Michael Bay, de filmes de ação medíocres como "A Rocha" e "Armageddon", atualiza e vulgariza o filme de Lucas. "A Ilha" mostra um futuro pós-apocalíptico em que sobreviventes são levados a um centro de tratamento e habilitados para serem enviados a uma ilha onde é armado o repovoamento do planeta.
Como em "THX", um protagonista inconformado de nome industrial, Lincoln Six-Echo (Ewan McGregor), passa a desconfiar desse universo utópico e descobre o amor por Jordan Two-Delta (Scarlett Johansson). Juntos, vão liderar a resistência contra essa superestrutura que sugere redenção, mas é voltada à destruição.
A atualização do filme de Lucas é aqui a parte inteligente. No mundo de hoje (ou melhor, no futuro concebido hoje), quem controla o sistema não é o governo, mas uma grande corporação. O mistério sobre a tal ilha envolve clonagem e um experimento secreto que poderia ser a evolução das pesquisas com células-tronco.
A vulgarização do original infelizmente está na alma do filme, na direção. "THX 1138" criava um universo opressor para o espectador à maneira do "2001" de Kubrick. "A Ilha" começa como ficção científica, mas logo se revela um filme de ação. Aparecem as perseguições, violência no mais alto grau, os cortes rápidos, confusos e entorpecentes. Numa cena, o mentor do projeto diz que os aspirantes a morar na ilha são criados para manter a idade mental de 15 anos. "A Ilha" faz o mesmo com seus espectadores.
Mas a violência da idéia central resiste até o final, fazendo esquecer (e perdoar) a violência banal. O desfecho tem uma ironia mordaz que associa a opressão das raças do futuro com a exploração histórica de outras raças em nosso mundo. Bay continua medíocre, mas nunca foi tão inteligente quanto aqui. É seu sexto longa, mas o primeiro longe da parceria com Jerry Bruckheimer. Prova de que um mau produtor em Hollywood tem o poder de sufocar diretores que têm lá seu potencial.


A Ilha
The Island
   
Direção: Michael Bay
Produção: EUA, 2005
Com: Ewan McGregor, Djimon Hounsou
Quando: a partir de hoje nos cines Anália Franco, Iguatemi e circuito


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