São Paulo, sexta-feira, 05 de agosto de 2005

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CDS

ELETRÔNICO

Disco de estréia do grupo, "Azul e Roxo", traz influências de trip hop

Dupla tara_code constrói climas sombrios em Salvador

BRUNO YUTAKA SAITO
DA REPORTAGEM LOCAL

Demorou mais de sete anos para que a banda tara_code lançasse seu disco de estréia, "Azul e Roxo", trabalho independente que explica, nas entrelinhas, muita coisa sobre o Brasil.
Antes de serem questionados sobre questões musicais, ouvem exclamações de surpresa e incredulidade ao falarem sobre suas origens. O grupo vem de Salvador, Bahia, e não está interessado na música festiva de axés e chicletes com bananas. Ao contrário, é uma banda musicalmente amarga e dura de mascar, com experimentais colagens sonoras.
"Às vezes, dá vontade de parar tudo e desistir, porque fazemos uma música muito diferente do que existe por aqui", diz a vocalista do tara_code, Andrea May, 39. O grupo resume, assim, anos e anos de práticas de uma fatia da música feita no Brasil que idealiza e busca referências do exterior.
Já que levaram quase uma década para estrear, diferentes influências moldaram seu espírito. Já tiveram vários guias: do rock britânico com letras em inglês às instrumentações mântricas e acústicas; encontraram identificação com o trip hop (a variante da música eletrônica mais lenta e soturna, com influências do hip hop) e o post-rock (rock geralmente instrumental mais experimentalista, com pretensões artísticas e conexões com o free jazz).
Apesar de coerente e coeso, o resultado não deixa de ter um certo ar nostálgico e algo passadista, já que o trip hop, em particular, é uma expressão que ficou mais associada aos anos 90. A dupla afirma que já superou essa fase, mas em faixas como "Rum Cake", a depressão do Portishead, em especial, se faz dominante, e homenagem se confunde com cópia.
"Todo meu referencial estético vem daí: Londres e fumaça. Sou apaixonada por São Paulo, amo poluição, desordem, cinza", diz May, que também é artista plástica e desenvolve projetos relacionados à "street art". "O som que faço é como uma trilha para a minha vida e minhas exposições."
Nesse filme-vida imaginário, May usa um canto quase falado para dar vida às suas letras abstratas. "A noite vai encher de medo a escuridão/ e o Sol só vem de dia pra limpar suas idéias/ ora, que hora mais absurda/ a mesma que passa por túneis, escadas e funerais", diz a faixa "Medo Pré-Mix".
Foi em Salvador, no entanto, que ela encontrou o par ideal. Logo que entrou na banda, o guitarrista Gilberto Monte, 29, definiu que May deveria cantar em português. Mais tarde, casou com a cantora e guiou uma faceta mais ligada à eletrônica. "Apesar de tudo, não somos os únicos a fazer um som alternativo", diz Monte. "Temos um público, por isso continuamos. É uma cena pequena, e são poucos lugares para shows", explica May, que cita como companheiros Tritor, Ronei Jorge e os Ladrões de Bicicleta e Rebeca Mata. No caminho, encontraram a cumplicidade do músico e produtor americano/brasileiro Arto Lindsay, que toca em "Passiflora", além de ser creditado no disco como "produtor associado". Em dias sombrios para o Brasil, o tara_code ironicamente serve de cartão-postal para uma nação sem motivos para festejar.


Azul e Roxo
   
Artista: tara_code
Lançamento: independente (distribuição: Tratore)
Quanto: R$ 22, em média


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