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Crítica
Produções escondem particularidades das cantoras com grifes
Com altos investimentos, CDs de Ana Carolina, Maria Gadú e Ana Cañas expõem repertório autoral imaturo
DA REPORTAGEM LOCAL
Pode-se dizer que a produção musical de um álbum foi bem executada
em duas circunstâncias. Quando, preocupada em trazer a primeiro plano a personalidade do
artista, ela não se deixa notar e
se torna invisível. Ou quando,
ao contrário, dá um jeito de
aparecer com mais intensidade
que o próprio artista, preenchendo o vazio causado pela
falta de personalidade dele.
Os lançamentos das cantoras
Ana Cañas, Maria Gadú e Ana
Carolina misturam essas situações de forma esquizofrênica.
No caso de Cañas e Gadú,
atuais apostas das gravadoras
Sony e Som Livre, o problema
parece ter vindo de cima. A produção esmerada dos respectivos álbuns importa-se pouco
em trazer à tona a novidade, os
talentos que essas mesmas artistas já demonstraram em
apresentações ao vivo.
Preferiram investir no hype e
formatá-las em padrões de qualidade do antigo mercado,
adornando o "produto" com
nomes reconhecíveis pelo público consumidor.
Marisa Monte
A estreante Gadú, 22, vem arrebanhando fãs entusiasmados
na imprensa carioca, principalmente por seu carisma cênico.
Mas ele não aparece no recém-lançado "Maria Gadú".
Repleta de contracantos e
"laialaês", a produção de Rodrigo Vidal mais evidenciou a impressionante semelhança vocal
entre Gadú e Marisa Monte do
que tentou detectar particularidades da artista que nascia.
Já que era para seguir os ensinamentos da veterana, os
produtores poderiam ter aconselhado Gadú a não expor tão
cedo seu repertório autoral,
ainda um tanto imaturo. Marisa não soltou nenhuma canção
de própria lavra até que estivesse devidamente estabelecida
por seu maior trunfo: a voz.
Vanessa da Mata
Segundo Alexandre Schiavo,
presidente da Sony Music, muitas das estratégias usadas agora
para alavancar a carreira de
Ana Cañas, 28, foras aprendidas com outra artista da gravadora: Vanessa da Mata.
Talvez por isso, Liminha, responsável por álbuns de Vanessa, tenha sido recrutado para
dar a pegada roqueira de
"Hein?", esse segundo trabalho
de Cañas. O produtor também
assina parcerias em oito de
suas 12 faixas.
Arnaldo Antunes fez as letras
de cinco delas. Por um lado, sua
presença minimiza as críticas
negativas que as composições
autorais do álbum de estreia da
cantora receberam. Por outro,
a quantidade ostensiva em que
essas parcerias aparecem agora
gera a suspeita de que ela esteja
tentando pegar onda na grife.
Em "Nove", novo CD de Ana
Carolina, 34, esse contraste fica
ainda mais óbvio. É constrangedora a diferença entre a letra
composta com Gilberto Gil e as
que Carolina fez com sua turma
(veja quadro).
A começar por sua capa, digamos, conceitual, o disco inteiro
tenta maquiar com uma vestimenta "cult" a inegável vocação
ultrapopular da cantora.
A produção, que ficou por
conta dos hypados Kassin (Orquestra Imperial, Caetano Veloso), Mario Caldato (Beastie
Boys, Bebel Gilberto) e Alê Siqueira (Tom Zé, Arnaldo Antunes), buscou tanto quanto pôde
conter os arroubos vocais da
cantora, famosa por se importar mais com volume que com
interpretação. Não fez milagre.
Vanessa da Mata também
serviu de modelo aqui. O formato de seu hit "Boa Sorte
(Good Luck)", criado em dueto
com Ben Harper, foi decalcado
por Carolina em "Entreolhares
(The Way You're Looking at
Me)", dueto com o cantor americano John Legend.
Além de Legend e de Gil, a
cantora e baixista de jazz americana Esperanza Spalding
também comparece no álbum.
Como talento e aura cult não
são transmissíveis como o vírus
da gripe suína, fazem pouca diferença no resultado final do
trabalho -popular no talo, como todos os seus anteriores.
Feito esses, deve vender muito.
(MARCUS PRETO)
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