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"Era pesado ter que me transformar"
Ex-Los Hermanos, Marcelo Camelo diz que recém-lançado CD solo tem músicas "mais parecidas" com o que ele é "em casa'
Compositor evita polêmicas, mas comenta diferenças entre seu novo trabalho e o da banda, que interrompeu atividades em 2007
LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO
Marcelo Camelo fala "é o
problema dos..." e pára, como
se não quisesse dizer "Hermanos" e dar brecha a alguma polêmica, algo a que é habitualmente avesso. Mas o compositor não tem como negar que
seu primeiro disco solo traz diferenças significativas em relação ao trabalho do Los Hermanos, a banda que interrompeu
atividades "por tempo indeterminado" em abril de 2007.
"Quando [você] faz uma música muito distante do que você
é, quando tem que evocar um
espírito muito distante de você,
enfim, se for um ritual de transformação muito radical, é pesado de se fazer como um ofício.
Para mim, era muito pesado
gritar, ter que me munir de um
espírito, ter que me transformar a cada noite", diz, referindo-se aos shows da banda.
"Eu comecei a fazer e a querer apresentar umas músicas
que fossem mais parecidas com
o que sou em casa, num estado
mais relaxado, para poder fazer
disso um ofício", diz ele, que
inicia turnê em Recife, no dia
19, e canta no Tim Festival, em
SP e no Rio, em outubro.
"Sou", que também se lê como "Nós" (de cabeça para baixo) no poema visual de Rodrigo
Linares na capa do CD, é a tradução desse "estado mais relaxado". Das 12 músicas divididas
em 14 faixas -"Saudade" e
"Passeando" também aparecem em versões instrumentais
com a pianista Clara Sverner-,
apenas "Mais Tarde" tem um
acento roqueiro.
No resto, prevalecem baladas
e canções, letras curtas e efeitos
(sons de praia, a empregada batendo um bife) que ele diz serem inspirados nas sobras em
fitas cassete de quando se grava
por cima do que foi gravado.
"Não penso que seja um disco de difícil apreciação. Até
porque não tem muita força. É
um disco fluido, tranqüilo", define, contestando a idéia de que
não é um CD dançante. "Nem
todo mundo quer dançar. Mas é
um dos discos mais dançantes
que já fiz. Tem um suingue,
uma dança qualquer."
Tem, por exemplo, um pouco
de samba-reggae em "Vida Doce" e muito de marchinha em
"Copacabana", que fala de "velhinhos" e "gordinhas". Homenagem ao bairro onde morou?
"Músicas não nascem assim
não, cara. Às vezes ouço umas
frases, não sei se já existiram ou
se vão existir, e assopro até virar uma fogueira. Mas não é assim: vou fazer uma música sobre Copacabana, sento com
uma caneta, com uma camisa "I
love Copacabana"..."
Vida de entrevistador de
Marcelo Camelo tem dessas dificuldades. Entre gírias, metáforas e cigarros, ele evita falar
das músicas ("Acho que qualquer decodificação vai ser menor do que a parada em si") ou
criar teses sobre seu trabalho.
Admite, ao menos, que o formato de "Sou" dificilmente caberia nos Hermanos:
"Às vezes eu estava tentando
compor uma coisa, imaginava
que não serviria para a banda e
já desanimava. Nesse disco,
não. Dei asas a todas as fagulhas
e soprei para ver se vingava".
O grupo está disperso: Rodrigo Amarante grava o disco "Little Joy", com Fabrizio Moretti,
da banda The Strokes; Bruno
Medina toca com Adriana Calcanhotto; e Rodrigo Barba, com
a banda Canastra. Mas Camelo
acredita num reencontro.
"O fato de a gente ter parado
em nome dessa preservação
possibilita um futuro. Se estivéssemos estendendo a nossa
empreitada, talvez não tivesse
[possibilidade]. Foi sensato o
momento, e essa sensatez permite pensar num retorno".
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