São Paulo, terça-feira, 05 de outubro de 2010

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29ª BIENAL DE ARTES

Performances exaltam falhas do vídeo

Projeto Tape Deck Solos convida artistas para mostrar material bruto usando só um videocassete e projetor

Ideia é resgatar estética característica desse suporte aposentado, fazer uma espécie de "arqueologia imediata"

SILAS MARTÍ
DE SÃO PAULO

Está nas imperfeições a mensagem. Numa espécie de celebração da morte do vídeo e ao mesmo tempo um resgate das fitas magnéticas, artistas vão mostrar na Bienal de São Paulo recortes de material bruto em VHS, usando só um videocassete e projetor.
Mesmo sem saber muito bem o que está gravado, Tadeu Jungle, Carlos Nader e Lucas Bambozzi são alguns dos nomes que vão encarar a plateia com solos improvisados de vídeo, como se orquestrassem essas imagens em vias de esfacelamento com os ecos tortos do jazz.
"Todo cinema é ao vivo", diz Gabriel Menotti, pesquisador que está por trás do projeto Tape Deck Solos. "É uma manifestação imediata dos aparelhos do cinema."
Mas no lugar de filme, projetor e todo o ritual que cerca a grande tela, Menotti armou um esquema modesto na Bienal. Mandou gente garimpar sobras de material bruto e fitas esquecidas no armário de casa para mostrar agora nesse outro tipo de performance.
"São imagens que nunca seriam editadas, são suficientes como registro do momento", diz Menotti. "É o suporte que tentamos resgatar, o videocassete como instrumento de análise e a ideia performática de exibir de improviso, como solo musical."
Num momento em que artistas da novíssima geração parecem empenhados em resgatar a estética de suportes analógicos, do vinil ao filme super-8 e VHS, Menotti tenta operar algo semelhante, entre o êxtase pelo passado e a tentativa de dar contornos mais claros ao vintage.
"É a ideia de exumar uma coisa e fazer dela matéria-prima para novas imagens", define Menotti. "Faço uma arqueologia imediata, uma reflexão rápida antes que sumam essas características."

PERDA DO PRESENTE
No caso, essas características são o quadriculado que aparece sobre a imagem gravada em mini-DV, as ondulações e falhas nas imagens das fitas VHS envelhecidas.
"Artistas reconhecem esses formatos antigos, como o super-8, mas não dão muita atenção ao que está mais próximo deles", observa Menotti. "É uma percepção do presente que está se perdendo."
De fato, cada vez que um desses vídeos é mostrado, mais um pouco se perde. Também faz parte dessa celebração do ocaso o desgaste sofrido nas exibições, como se voltassem a ser enterrados esses fragmentos de imagem.
Na lógica do Tape Deck Solos, estão catalogados os materiais em imagens anteriores, aquelas que viraram filme depois, as impossíveis, que nunca foram editadas, as persistentes, transmutadas em outros produtos, e suficientes, material bruto que vale como obra final, como filmes caseiros da família.
Suficientes ou não, são tentativas de voltar os olhos para a beleza estranha de um passado recente, que ressurge agora todo refletido no espelho imperfeito do vídeo.


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