São Paulo, sexta-feira, 05 de dezembro de 2008

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Crítica/"Appaloosa - Uma Cidade sem Lei"

Mesmo hesitante, Harris renova faroeste

Personagem de Zellweger destoa das mulheres retratadas pela tradição do western em "Appaloosa - Uma Cidade sem Lei"

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

Todo faroeste contemporâneo é antes de tudo evocação dos faroestes do passado. Existe uma ou outra exceção, mas "Appaloosa" não faz parte delas. É como se Ed Harris, o diretor, buscasse sempre entrar em contato com um tempo passado, tais e tantos são os momentos em que vemos a tradição se enfiar em seu faroeste.
Appaloosa, no Novo México, é uma cidadezinha dominada, nos idos de 1880, pelo vilão Randall Bragg (Jeremy Irons). Para combatê-lo são contratados dois veteranos da Guerra de Secessão, o xerife Virgil Cole (Harris) e seu assistente Everett Hitch (Viggo Mortensen).
Na verdade, não existe problema maior nesse recurso à tradição: o faroeste é assim mesmo, um gênero tradicional.
No mais, Harris empenha-se em fazer um filme "de ator": o que coloca em destaque é antes de mais nada o talento dos colegas que trabalham no filme.
Até o uso preferencial dos tempos longos trabalha a favor deles. Esses tempos também ajudam a compor uma atmosfera estranha, sobretudo no início: os personagens são bem mais reflexivos do que se pode esperar dos habituais westerns.
Estabelecido que o combate central do filme é entre Bragg e Cole, aliás Irons e Harris, surge em cena a mulher, na pessoa de Allison French (Renée Zellweger). É o lance de originalidade do filme, pois Allison destoa inteiramente das mulheres que o Oeste nos legou até hoje.
É verdade que ela começa se encantando pela pessoa do xerife, ou seja, chega no terreno da pura convenção. Mas com o tempo o filme vai mostrá-la com outras tintas: como uma mulher de desejo.
Por que Allison sai com o primeiro homem de poder que aparece? Pode ser necessidade de sentir a presença de um homem forte a seu lado, pode ser qualquer outra coisa.
O xerife Cole responderá de modo original, nada a ver com o macho tradicional dos manuais: ele é o sujeito que tenta entender a mulher, saber por que age assim. Seja porque ele é um bamba do gatilho seja por qualquer outro motivo, ninguém ousa questioná-lo.
Apesar da originalidade da proposição, ela tem o inconveniente de dispersar um pouco as coisas, de colocar a história original em surdina, a tal ponto que no final podemos perguntar se Virgil Cole era mesmo o herói da história.
"Appaloosa" representa um claro avanço em relação a "Pollock", estréia de Harris na direção. É um filme hesitante entre as várias linhas que desenvolve. Mas não há dúvida de que mais vale hesitar ou até perder-se do que apegar-se à segurança do filme "artístico".
Este aqui está vivo, é capaz de surpreender o espectador em seus hábitos e desestabilizá-lo.
De resto, convém não esquecer que ver Jeremy Irons na pele de um vilão de faroeste não deixa de ser uma aspiração de qualquer fã de cinema.


APPALOOSA - UMA CIDADE SEM LEI
Direção:
Ed Harris
Produção: EUA, 2008
Com: Ed Harris, Viggo Mortensen
Onde: a partir de hoje nos cines Lumière, Iguatemi Playarte e circuito
Classificação: não indicado a menores de 14 anos
Avaliação: bom



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