|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Pra (re)começar
De mudança para São Paulo, Marina Lima ensaia show, prepara disco e aguarda lançamento de DVD e de primeiro livro
Lucas Uebel/Preview.com
|
|
Marina ensaia novo show em estúdio de Porto Alegre (RS)
MARCUS PRETO
ENVIADO ESPECIAL A PORTO ALEGRE
Como na letra de uma de
suas baladas mais famosas, Marina Lima, 54, procura agora
por outros olhos e armadilhas.
A cantora está de mudança
para São Paulo. Ensaia show
com repertório basicamente
inédito, dirigido pelo arquiteto
Isay Weinfeld. E que deve gerar
um CD de estúdio neste ano.
Também está previsto para
2010 o primeiro livro, "Entre as
Coisas", "quase um almanaque" que reúne, segundo ela,
"as coisas que me interessam: o
mundo da música, do canto, das
mulheres".
E, por fim, o DVD que registra o emblemático show "Primórdios", dirigido por Monique Gardenberg em 2006.
Marina recebeu a reportagem da Folha no estúdio em
Porto Alegre onde ensaia com
sua banda. "Porto Alegre me
parece ser um lugar de muita
gente de ponta. Leia-se: à frente. Leia-se: maluco", brincou.
FOLHA - Você já viveu algumas
temporadas em São Paulo. No que
sua saída do Rio é diferente agora?
MARINA LIMA - Agora, vou sair
para viver. Quero começar minha vida. Recomeçar de outro
ponto, em outro lugar. Tem um
"começar de novo" nisso, mas
tem também um continuar.
Quando quis estudar guitarra,
fui para São Paulo. Quando quis
entender a linguagem dos computadores, fiz a mesma coisa. A
cidade me atrai. É como se estivesse me mudando para outro
país que fala a mesma língua.
FOLHA - Uma espécie de desafio?
MARINA - Começar tudo de novo em outra cidade é uma grande mudança. Domino o Rio. A
cidade me é familiar, é fácil viver nela. Mas estou muito isolada. O que tenho no Rio? Minha
casa, meus familiares, mas não
tenho muito com quem trocar.
FOLHA - Isolada como? A sua turma não é mais...
MARINA - Não faço parte de turma, nunca fiz. Do auge do meu
sucesso até agora, era só eu e o
[irmão Antonio] Cicero. Não
sou do Asdrúbal, não sou da
turma dos baianos. Acontecem
coisas singulares comigo no
Rio. Vou ao cinema sozinha, faço tudo sozinha.
FOLHA - Vai vender a casa no Rio?
MARINA - Minha casa não é
mais minha. Morei anos sozinha em uma cobertura enorme
na Lagoa. Pensei muitas vezes:
"De que me adianta essa vista?". Vendi aquela cobertura e
aluguei um apartamento em
Ipanema sem vista nenhuma,
só com vista para dentro. E
muito menor. Está tudo espremido. Então São Paulo representa, agora, voltar ao paraíso.
FOLHA - Mudanças pessoais estimularam a mudança de cidade?
MARINA - Envelheci e passei a
investir em outras coisas, em
estar mais em casa, ler, ficar no
computador. E gostei. É como
se agora isso não fosse mais
perda de tempo. No Rio, viver
assim não funciona muito porque você para de circular em lugares centrais para a coisa social continuar acontecendo.
FOLHA - Você registrou um de seus
shows mais emblemáticos, "Primórdios", que seria lançado em DVD...
MARINA - "Primórdios" parecia
ser minha grande volta aos palcos. Porque "Sissi na Sua"
[show de 2000], que teria sido
essa volta, era muito radical. Eu
estava saindo daquela loucura
toda [perda da voz causada por
depressão], era um show sobre
as dificuldades que as pessoas
que não se adequam têm de
passar para não morrer.
FOLHA - O público não entendeu?
MARINA - Alguns nerds se conectaram, mas não o grande
público. Eles esperavam aquela
Marina, e aquela Marina não
voltou. Aquela nunca mais vai
voltar. Não existe volta. Existe a
continuidade das coisas. Aquele show representava um esforço para dizer: "Eu não fui, eu
não morri, a loucura não me sucumbiu, eu consegui voltar".
Mas não voltei igual, voltei talvez até ameaçadora para quem
está acomodado. Para algumas
pessoas, a vida não tem crise.
FOLHA - Falar abertamente sobre
depressão incomoda, é isso?
MARINA - Acho que é um estigma. Fui fichada porque tive depressão, marcada que nem gado. É como ficha na polícia.
Tem gente que fica fingindo. O
Silvio Santos, por exemplo.
Ninguém quer saber se o cara
teve derrota, se tem problemas
pessoais. O que interessa para o
mundo é aquele sorriso dele.
Não faço essa linha. Sou fascinada pela vida, com a dor que
isso possa implicar.
FOLHA - O DVD vai sair?
MARINA - Vai. Mas não vou dizer datas. Fiquei constrangida
porque andei divulgando prazos de lançamento de um livro
que está sendo feito, mas não
consegui cumprir porque não
depende de mim. Se eu fosse
dona da banca... Meu tesão por
esse ofício voltou com tudo, e a
idade pode ser um fator determinante nisso. É a proximidade
da morte. Mas, enquanto estou
viva, o conhecimento me excita. O mundo anda, e você não
pode achar que é uma obra acabada. É uma obra em aberto. A
não ser que queira ficar lá, cristalizada. Não é o meu caso.
Texto Anterior: Mônica Bergamo Próximo Texto: Música/Crítica/"Brillante": Antonio Meneses interpreta clássicos de Bach no violoncelo Índice
|