|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Livrarias recebem as entrevistas de Peter Bogdanovich com 16 cineastas de Hollywood
O homem que perguntava demais
Reprodução
|
Peter Bogdanovich (dir.) em uma das várias entrevistas feitas com o cineasta Alfred Hitchcock em escritório dos Universal Studios (Los Angeles), no ínício dos anos 70 |
SÉRGIO RIZZO
especial para a Folha
O nome dele é Peter Bogdanovich, mas podem chamá-lo de o
homem que perguntava demais.
A prova do crime é o livro "Afinal,
Quem Faz os Filmes", em que 16
cineastas de Hollywood foram
submetidos à sua curiosidade insaciável sobre bastidores.
O pai, diretor de teatro, foi
quem lhe disse que a melhor maneira de aprender era procurar os
melhores no ramo e perguntar-lhes como trabalhavam. Bogdanovich aceitou o conselho e fez
amizade com diversos mitos do
cinema americano.
Deu certo. "A Última Sessão de
Cinema" (71), "Esta Pequena É
uma Parada" (72) e "Lua de Papel" (73) o tornaram um dos nomes quentes do cinema norte-americano. Mas o fracasso de
"Muito Riso e Muita Alegria" (81)
corroeu-lhe as economias e quase
destruiu sua carreira.
Autor de livros sobre John Ford,
Orson Welles e Fritz Lang, é um
caso raro de cineasta que também
escreve sobre cinema. Outros dois
livros vêm aí, contou Bogdanovich em entrevista exclusiva por
telefone à Folha, de Los Angeles: a
íntegra das seis sessões de entrevistas que fez com Hitchcock e
"Who the Devil's in It" (ou "afinal, quem atua nos filmes"), sobre
atores. Seu próximo filme, "The
Cat's Meow", é baseado em um
crime ocorrido na África em 1924.
"Essa história nunca foi contada e
envolve pessoas como Charlie
Chaplin, Marion Davies, William
Randolph Hearst e Louella Parsons", afirmou.
Folha - Você conta no livro
que John Ford e Howard Hawks
ironizavam a quantidade de
perguntas que fazia a eles. Os
cineastas que entrevistou gostavam de conversar sobre o próprio trabalho?
Peter Bogdanovich - Entre todos os diretores que já conheci, o
que mais gostava de falar era
Hitchcock. Falava horas sobre a
sua técnica e como as coisas eram
desenvolvidas. Na verdade, era
um grande professor. Hawks não
gostava tanto de conversar sobre
o aspecto técnico. Preferia contar
como obtinha determinada resposta dos atores. Tinha uma
abordagem diferente, mais humana. Ford, bem... Ford não gostava de falar sobre nada.
Folha - Todos os diretores que
entrevistou em "Afinal, Quem
Faz os Filmes" acreditam na primazia da imagem. E você?
Bogdanovich - Sim. Todos eles
cresceram com o cinema mudo,
em que a imagem era tudo. Ela
contava sozinha a história. Originalmente, o cinema era assim. Na
minha opinião, seu aspecto dominante é a imagem. Infelizmente,
hoje ela não controla mais o processo. Mas os cineastas que fundaram essa arte acreditavam que
a imagem representava tudo. E
era uma arte única, porque não tinha nada a ver com o teatro. Tinha a ver apenas com algo chamado... cinema.
Folha - O escritor Gore Vidal
afirma que os roteiristas, e não
os diretores, são os verdadeiros
autores de muitos filmes.
Bogdanovich - Com o advento
do som, isso se tornou frequentemente verdade. Mas a qualidade
do filme em termos artísticos continua a depender da imagem. Hoje, o som tem primazia. Mas filmes, entendidos como obra de arte, não dizem respeito a isso.
Folha - Você diz no livro que a
personalidade do diretor está
sempre atrás de seus filmes. Como identificá-la?
Bogdanovich - Você assiste aos
filmes dele e começa a reconhecer
coisas. Um interesse nos mesmos
temas, por exemplo. Mas não é algo fácil. Tem a ver com as imagens e com o modo de contar a
história. A personalidade de
Hitchcock é uma das mais fáceis
de reconhecer. John Ford também, principalmente depois de
1939. Se você assiste a muitos filmes dele, começa a perceber como foram feitos. Orson Welles é
outro. No caso de Hawks, é difícil
compreender pela primeira vez,
porque ele fez diferentes tipos de
história, trabalhou em todos os
gêneros. Em um determinado
momento, fica mais fácil identificar a sua personalidade.
Folha - Na década de 70, você
foi sócio de Francis Coppola e
William Friedkin em The Directors Company, uma produtora
independente em Hollywood.
Por que ela fracassou?
Bogdanovich - Foi uma idéia
muito boa, destruída pela ambição. A idéia era possibilitar que
dirigíssemos o filme que bem entendêssemos, sem obter aprovação de ninguém, por até US$ 3
milhões. E que produzíssemos
qualquer filme por até US$ 1,5 milhão.
Fiz dois filmes assim lá, "Lua de
Papel" (73) e "Daisy Miller" (74).
Francis fez um, "A Conversação"
(74). O único bem-sucedido comercialmente foi "Lua de Papel".
Logo depois, a companhia quebrou, basicamente porque Francis e Billy queriam levantar mais
dinheiro para seus filmes do que
The Directors Company poderia
lhes adiantar e eles tinham como
obter isso em qualquer outro lugar, para fazer coisas como "O
Exorcista" (73).
Folha - Todos os grandes filmes já foram feitos?
Bogdanovich - Sim (risos). Nós
podemos aprender com eles. E
tentar fazer algo bom.
O problema é que as novas gerações de cineastas se interessam
cada vez menos pelo passado.
Não sei se isso é verdade no Brasil,
mas certamente o é neste país.
Texto Anterior: Programação de TV Próximo Texto: "Afinal, Quem Faz os Filmes" cheira a cinema Índice
|