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Retrato do artista quando velho
Ator goiano de 26 anos desponta com capacidade de transform ação no palco
Lenise Pinheiro/Folha Imagem
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Lee Thalor como Policarpo na peça de Antunes Filho
GUSTAVO FIORATTI
DA REPORTAGEM LOCAL
Na primeira vez em que o
goiano Lee Thalor, 26, fez teste
para entrar no Centro de Pesquisa Teatral -o CPT de Antunes Filho-, em 2002, disseram-lhe "não". Estavam à procura de pessoas mais velhas.
Dois anos se passaram, e ele
voltou a se inscrever. Foi admitido, ficou um ano entre coadjuvantes e, enfim, passou a emplacar uma série de protagonistas que, ironia do destino, estão
quase sempre 20 e poucos anos
à frente de sua faixa etária.
Seu nome incomum mistura
um personagem do filme "Planeta dos Macacos" e uma homenagem ao ator Lee Majors.
A capacidade de envelhecer
em cena, ou de incorporar os
personagens masculinos que
têm despontado ao primeiro
plano das peças de Antunes,
tornaram-se marca de seu trabalho. Hoje, Thalor interpreta
o protagonista de "Policarpo
Quaresma", um sujeito de 46
anos que, levado ao palco, aparenta ser ainda mais velho.
O personagem mantém um
cavanhaque à Visconde de Sabugosa, a voz grave e volumosa,
os joelhos sempre um pouco
dobrados para caminhar.
Além do desafio de incorporar trejeitos da idade, ainda pesa o conflito de um sujeito que,
em duas horas de espetáculo, é
jogado contra sua ingenuidade.
Um conflito psicológico que
poucos dão conta de expressar.
Fora de cena, tem cara de garoto e os olhos expressivos, puxados e arregalados como os de
um chinês que levou um susto.
Deixar essa jovem (e forte)
aparência de lado, para ele, é
um trabalho de minúcia. Para
compor seu Policarpo, recorreu a fontes inúmeras, cozinhando numa mesma receita
os personagens Cândido, de
Voltaire, o Idiota, de Dostoiévski, muitos papéis de Chaplin e
também o imperador Hiroíto,
que o ator Issey Ogata interpreta no filme "Sol", de Sokúrov.
Mais difícil do que essa composição foi fazer a do Misael, de
"Senhora dos Afogados", que
tem entre 50 e 60 anos. Durante os ensaios, Thalor foi três vezes à sala de Antunes, procurou
sua expressão mais séria, sentou-se e disse: "Escuta, Antunes, não vou conseguir. Já no
meu segundo trabalho você vai
liquidar com a minha carreira".
Antunes é duro na queda. E
Thalor teve de fazer o papel.
O jeito foi passar horas a fio
assistindo à TV Senado, para
pegar emprestado de políticos
um jeito próprio de lidar com
situações que, na peça, deságuam em tragédia familiar. Detalhe que, no elenco, ele era
mais jovem inclusive do que os
atores que interpretavam seus
dois filhos e sua mulher.
A relação com Antunes é parecida com a de outros talentos
que passaram por lá, como Luís
Melo, Giulia Gam, Samantha
Monteiro e Juliana Galdino.
Thalor refere-se a Antunes
como mestre e compreende os
acessos de raiva do diretor durante ensaios, que estão diminuindo conforme ele envelhece. "O Antunes só quer que a
gente faça um bom trabalho."
Hoje, o ator ri do susto que
tomou quando o diretor atirou
-"sem a intenção de acertar"-
um banco em sua direção, tentando arrancar uma expressão
que ele não conseguia alcançar.
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