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CRÍTICA
Camurati conduz filme com doçura e impolidez
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
Às vezes parece que existem
dois filmes no "Copacabana" de Carla Camurati.
Se retivermos os primeiros planos de Marco Nanini, fazendo Alberto, um senhor de 90 anos que
passou toda vida no bairro, o filme é um: é a história de um rosto
e suas transformações, uma busca
do tempo perdido; tentativa de
conter os efeitos do tempo, promover o encontro entre as memórias pessoal e coletiva do lugar.
Se retivermos, porém, cenas como a de uma senhora octogenária
a se masturbar numa sala, a história é um pouco diferente. Então,
Camurati está refletindo, ainda,
sobre o correr do tempo e seus
efeitos, a decrepitude do corpo e a
permanência do desejo. Mas é
bem outro o andamento.
No primeiro registro, estamos
no sublime, ou quase: o rosto ou o
andar do velho homem são confrontados a cenas de sua infância
e juventude. Tudo o que parece
atravessar seu corpo são pensamentos idos e vividos. No outro
registro, a vulgaridade dá o tom.
É desse tipo de abismos que se
faz "Copacabana". Eles parecem
atravessar todas as instâncias do
filme. Quando Carla Camurati filma personagens na rua, vemos
passantes, atrás, que por vezes
olham para a câmera. Seria um
defeito? Pode-se ver a coisa assim.
Mas é nisso que reside a perfeita
intimidade da diretora com o cinema: em vez desses figurantes
arranjadinhos, temos a pulsação
da rua, sua verdade. Distingue
coisas vivas de mortas e evita armadilhas do novo-riquismo.
Ao mesmo tempo, quando registra a mulher que se masturba,
não se pode acusá-la de mentir.
Mas sua verdade sofre de ingenuidade e falta de tato.
A alternância de momentos
pertinentes e outros menos, de interpretações felizes e desastrosas,
de frases justas e outras supérfluas, de soluções inventivas e banais é desconcertante.
Já é assim no roteiro. Quando
opta por reduzir o passado de Alberto a alguns momentos específicos, Carla ensina à maior parte
de seus colegas que para reconstituir uma vida não é preciso repassá-la ano a ano. Quando, no entanto, introduz no grupo de amigos de Alberto, judeu, cuja única
função parece ser reforçar certos
lugares-comuns sobre os judeus,
tem-se o extremo oposto: da vacuidade e da grosseria.
No filme, sente-se a oscilação.
Cenas como a de abertura, que
começa em Copacabana de quase
cem anos atrás e termina nos dias
de hoje, são eficazes. Já as menções ao envelhecimento pecam
pela dispersão ou pela repetição.
Ver "Copacabana" é como passear numa montanha-russa, onde
se alternam a vitalidade e o prazer
do cinema e o apelo ao grátis. Partilha-se a ternura da diretora por
seus personagens, mas também
ressente-se a evolução meio aos
trancos e barrancos. É um filme
que se aceita, ou não, como vem.
Copacabana
Direção: Carla Camurati
Produção: Brasil, 2001
Com: Marco Nanini e Louise Cardoso
Quando: a partir de hoje no Espaço
Unibanco, Cinemark e outros
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