São Paulo, quarta-feira, 06 de julho de 2011

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OPINIÃO

Inquieto, Chamie explorou os limites da linguagem poética

REYNALDO DAMAZIO
ESPECIAL PARA FOLHA

A trajetória poética de Mário Chamie (1933-2011) foi marcada pela dissidência ao movimento de Poesia Concreta, com a publicação de "Lavra Lavra" em 1962, ganhador do Prêmio Jabuti.
Com o livro, lançou a poesia práxis, que reagia ao caráter objetivo do texto preconizado pelos concretistas, com uma proposta mais engajada com as dimensões histórica, corporal, política e discursiva do poema. Segundo Mário Chamie, "o autor práxis não escreve sobre temas. Ele parte de "áreas" (seja um fato externo ou emoção), procurando conhecer todos os significados e contradições possíveis e atuantes dessas áreas, através de elementos sensíveis que conferem a elas realidade e existência".
Antes desse enfrentamento às diretrizes radicais dos poetas concretos, como ocorreu com Ferreira Gullar ao fundar o neoconcretismo, em 1958, Chamie havia publicado três volumes de poemas: "Espaço Inaugural" (1955), "O Lugar" (1957) e "Os Rodízios" (1958).
Neles predominava uma dicção reflexiva, próxima do estilo metafísico da Geração de 1945, de onde também vieram Haroldo (1929-2003) e Augusto Campos e Décio Pignatari, integrantes do grupo vanguardista Noigandres.
Em todos os livros, no entanto, havia o desconforto com o viés passadista daquela tendência e certa inquietação com a linguagem poética, ou com a tensão entre seus limites e possibilidades.
Não é justo com a produção literária e ensaística de Mário Chamie circunscrevê-la apenas a um ferrenho contraponto ao concretismo. Com a publicação de "Indústria", em 1967, em pleno momento de ascensão de ditadura militar, Chamie buscou uma renovação na poesia práxis com o chamamento para a relação dialética entre autor, texto e leitor, criando a figura do "textor".
A força do texto poético, nesta perspectiva, estava em fazer com que a linguagem levantasse "as contradições de uma área", vale dizer, que o poema atuasse para além do fonema (letra) e do monema (palavra), mas como unidade de sentido provocador de consciência crítica.
Em seus ensaios, além de uma leitura da poesia contemporânea, destaca-se a preocupação em rever o modernismo de 1922.
A proposta de trazer para o poema as contradições e imperfeições do real se desdobrou em livros de diferentes questionamentos, entre o lírico e social, como "Objeto Selvagem" (1977), "A Quinta Parede" (1986), "Horizonte de Esgrimas" (2002), "A Palavra Inscrita" (2004), até os recentes "Pauliceia Dilacerada" (2009) e "Neonarrativas -°Breves e Longas" (2011).
Mário Chamie tem ainda no currículo o feito de ser o criador do Centro Cultural São Paulo, em sua gestão como secretário municipal da Cultura, de 1979 a 1983.

REYNALDO DAMAZIO é editor e poeta, autor de "Horas Perplexas" (Editora 34).


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