São Paulo, sábado, 06 de agosto de 2005

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POESIA/"ESSA LOUCURA ROUBADA"

Antologia compila lirismo boêmio de Charles Bukowski

JOCA REINERS TERRON
ESPECIAL PARA A FOLHA

Os romances e contos de Charles Bukowski obtiveram repercussão no Brasil à revelia do veio central de sua produção, a poesia, que somente há pouco começou a ser descoberta por aqui.
Autor de mais de 40 títulos do gênero, o escritor nascido na Alemanha e morto em 1994 foi descoberto pelo editor John Martin em 1965. Em pouco tempo, as vendas permitiram a Martin pagar uma mesada a Bukowski, que pôde deixar seu emprego e se dedicar de fígado e alma à literatura e à boemia.
Desde o início conhecido por sua poética, apenas tardiamente Bukowski experimentou os rigores da prosa. Autor de seis novelas superestimadas por seu público fiel, o legendário bêbado de Los Angeles sempre se saiu melhor nos textos de menor fôlego. Pudera: fôlego não é lá coisa que se exija de um notório pau d"água.
E em uma análise justa, boa parte de seus "poemas" não deixa de ser anotações em diários com as linhas quebradas. Porém, quando o velho bardo supera a ressaca e com mão firme acerta o alvo, ah, aí então se tem a mais pura e destilada poesia, envelhecida no coração e na mente. Destoando do niilismo de seus romances, que exploram à exaustão o submundo de prostitutas e bêbados, a melhor poesia de Bukowski é lírica e trata de temas caros ao gênero, como solidão, morte, amor e sexo. Sua maior qualidade, no entanto, reside numa característica rara na poesia contemporânea: pode ser lida e -o principal- ser compreendida, sem que o leitor tenha uma vasta bagagem de leituras.
Devido à sua enorme produção, o trabalho mais complicado para o leitor de Bukowski sempre foi separar o joio do trigo, uma preocupação presente nesta antologia. Centrada na produção inicial do escritor, a seleção é um dos pontos fortes do livro, além da tradução de Fernando Koproski, que se esforça por manter o coloquialismo tão fundamental para a beleza dos originais. Poderia ser difícil identificar a beleza na literatura desse repórter do mundo cão, não fossem versos como "Não se esqueça:/ o tempo existe é para ser desperdiçado,/ o amor fracassa/ e a morte é inútil". Afinal a poesia de Bukowski obtém a atenção merecida num livro que é, desde já, referencial.


Joca Reiners Terron é escritor, autor de "Hotel Hell" (Livros do Mal), entre outros

Essa Loucura Roubada Que Não Desejo a Ninguém a Não Ser a Mim Mesmo     
Autor: Charles Bukowski
Editora: 7 Letras
Quanto: R$ 39 (256 págs.)


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