São Paulo, sábado, 06 de agosto de 2005

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FILOSOFIA

Com nomes ligados ao PT, como Fernando Haddad, "O Silêncio dos Intelectuais" acontece em meio à turbulência política

Seminário discute a crise do pensamento

LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO

O filósofo Adauto Novaes atirou no que pensou e acertou no que não imaginava. Ao conceber, há quase dois anos, o seminário "O Silêncio dos Intelectuais", ele não podia prever que as conferências fossem acontecer no auge da crise do governo Lula. A série começa no dia 22, e as inscrições estão abertas a partir desta segunda-feira, em São Paulo, Rio, Belo Horizonte e Salvador.
Tão involuntária quanto a data do seminário foi a cronologia das palestras. Mas o acaso fez com que, entre os primeiros conferencistas, estivessem a filósofa Marilena Chauí (intelectual de proa do PT), o sociólogo Francisco de Oliveira (um dos primeiros intelectuais a romper com o PT no governo Lula) e o economista Fernando Haddad (atual ministro da Educação).
"Foi pura coincidência. Haddad nem ministro era. Acho que eles vão falar de algo mais geral, mas, nas perguntas da platéia, certamente surgirão temas atuais. E isso é bom, para que eles elaborem alguns pensamentos [sobre a crise]", afirma Novaes.
Chauí, Oliveira e Haddad estão no primeiro bloco imaginado por Novaes, em que se pretende refletir sobre "o papel e a função do intelectual hoje em contraponto ao intelectual clássico".
"Depois de Sartre, não houve mais uma figura que galvanizasse a idéia do intelectual clássico, aquele que luta pelos ideais universais, que não defende interesses específicos. Vamos discutir as razões pelas quais o intelectual saiu de cena", diz o organizador.
O segundo bloco, que começará com Sérgio Paulo Rouanet, pretende enfocar a crise do papel dos intelectuais a partir da "crise dos universais", expressão que dá título à palestra do filósofo.
"Universais são idéias como razão, justiça e liberdade. Hoje há o predomínio do relativismo na cultura, no pensamento e na política", explica Novaes.
O eixo final trata de outra crise, a da palavra. Participam dele, entre outros, os compositores Antonio Cícero e José Miguel Wisnik. Em um época em que o presidente dos Estados Unidos utiliza um argumento sem comprovação para desencadear uma invasão ao Iraque, fica nítido que as palavras, arma principal dos intelectuais, estão desvalorizadas.
"Hoje, as palavras perdem o sentido e passam a ser tratadas como um valor como outro qualquer. Quase se reduzem a um valor mercadológico", diz Novaes.
Para ele, essa crise da palavra ajuda a explicar por que os intelectuais se sentem impotentes diante da crise nacional, ainda não assumindo posições públicas mais firmes. "Defender que se punam os responsáveis é pouco, é lugar-comum. O intelectual tem que buscar o futuro, apontar caminhos. Mas, como a palavra está sem valor, qualquer coisa que se diz pode ser interpretada de maneira conveniente", afirma.
O problema se une a outro: será que é possível a existência de um "intelectual midiático", que consiga refletir dentro dos meios de comunicação de massa?
"Nas mídias, especialmente a eletrônica, a tendência é substituir o pensamento pela opinião. Mas uma opinião é expressão de interesse, paixão ou capricho. E, em um círculo vicioso, uma opinião se contrapõe a outra, fica algo vazio. O tempo do intelectual não é o da mídia", diz Novaes.
Ainda segundo ele, não faz sentido dizer que nos últimos anos houve intelectuais no poder no Brasil. Fernando Henrique Cardoso, ao ser presidente não atuava como intelectual, "porque as coisas não se misturam"; e Lula, apesar da história do PT, não está cercado de pensadores.
"Pessoas, por exemplo, como Antonio Candido e Marilena Chauí não estão lá [no poder]. Não sei se seria melhor, mas algumas coisas não teriam acontecido", afirma o filósofo.
Viabilizado pela Petrobras e pelo Fundo Nacional de Cultura, "O Silêncio dos Intelectuais" abre uma trilogia de seminários, que será completada em 2006 por "O Esquecimento da Política" e "A Política do Espírito". Durante a série deste ano, serão lançados livros que resultaram de duas séries anteriores: "Poetas que Pensaram o Mundo" (Companhia das Letras) e "Muito Além do Espetáculo" (Senac).


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