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LIVROS
Crítica/"Reencontros na Travessia - A Tradição das Carpideiras"
Com poesia, romance aborda histórias das mulheres que choram os mortos
CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL
Herdeiras de uma arte
milenar, as míticas
carpideiras, mulheres
com a missão de reverenciar os
mortos, acabam de ter sua história recuperada e contada de
forma singular, quase poética.
Em seu segundo romance,
"Reencontros na Travessia: A
Tradição das Carpideiras", a
médica e escritora maranhense
Fátima Oliveira usa a história
de amor de Cacá e Pablo como
eixo para desvendar a vida dessas mulheres anônimas, que
têm a fama (injusta, segundo a
autora) de chorar o defunto
alheio em troca de dinheiro.
Desde antes de Cristo, as carpideiras (do verbo carpir, do latim carpere, arrancar cabelos e
barbas em sinal de dor) tinham
a missão de encomendar o corpo de quem morreu para que
sua alma ascendesse aos céus.
Era um rito de passagem do
mundo terreno à eternidade.
As carpideiras profissionais
foram conhecidas em toda a
Europa. Os romanos, por
exemplo, consideravam esses
rituais indispensáveis e dividiam as carpideiras em duas
classes: a "Prefica", paga para
cantar os louvores do morto, e a
"Bustuária", que acompanhava
o cadáver ao local da incineração, pranteando-o de forma estridente. Ambas seguiam uma
tabela de preços.
No Brasil, grande parte das
carpideiras descende da tradição portuguesa. São espontâneas, lamentam o defunto gratuitamente ou vocacionalmente -mas também não recusam
qualquer tipo de ajuda oferecida pela família do morto.
Dor amansada
Em "Reencontros", a morte
ganha um outro sentido. Após o
enterro da tia Lali, líder das carpideiras da localidade onde o
romance é ambientado, a protagonista Cacá comenta: "Tia
Lali não foi enterrada, foi plantada". Plantar os entes queridos em vez de enterrá-los
-existe figura de linguagem
mais apropriada para amansar
a dor da despedida?
À medida que o romance
avança, o leitor viaja para Grotões dos Bezerras, cidade fictícia do Maranhão, com sua gente simples, sistemas de moralidades e festas memoráveis.
Lá, conhecerá os pratos regionais, como a salada de flores
com castanhas de caju, e também escutará a alvorada -festa
com músicas no amanhecer.
Além da casa de tia Lali e sua
penteadeira abarrotada de frascos de perfumes importados, o
leitor dará um pulo na casa da
Socorrinha para admirar seu
jardim com imensas folhas verdes de jibóia e um roseiral a
perder de vista. Na volta, ouvirá
cantos em memória à tia Lali.
Autora de oito livros (a maioria na área de bioética), Fátima
Oliveira vive em Belo Horizonte e fala com propriedade desse
rico sertão já descrito por Guimarães Rosa, na obra "Grande
Sertão: Veredas". "A minha paixão pelo sertão permite que o
sertão viva em mim. E eu o carrego, sempre. Onde estou, está
o sertão", diz a autora.
REENCONTROS NA TRAVESSIA
Autora: Fátima Oliveira
Editora: Mazza Edições
Quanto: R$ 30 (256 págs.)
Avaliação: bom
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