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Crítica/dvd/"Acaso" e "Cinemaníaco"
Filmes são Kieslowski em formação
"Cinemaníaco" e "Acaso", lançados agora em DVD, estão entre os primeiros longas de ficção realizados pelo polonês
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
Krzysztof Kieslowski
(1941-96) começou fazendo documentários.
Esse aprendizado deu-lhe a segurança necessária para que,
ao encarar a ficção, seu cinema
estivesse colado ao real e, ao
mesmo tempo, o transcendesse esteticamente.
Dois dos primeiros longas de
ficção do diretor polonês chegam ao DVD e atestam o seu rápido amadurecimento como
autor de cinema.
"Cinemaníaco" (1979) oscila
entre a sátira política e o melodrama pessoal ao narrar a história de um funcionário de empresa estatal (Jerzy Stuhr) que
compra uma câmera de 8mm
para filmar o nascimento do filho e acaba se tornando, primeiro, o cineasta oficial da firma e, depois, um incômodo documentarista da vida cotidiana
de sua cidade.
Já estão presentes ali algumas marcas do futuro criador
do "Decálogo": o foco em personagens em situações de impasse, o pendor para as paisagens desoladas, o uso criterioso
da câmera na mão.
Mas é em "Acaso", feito em
1981 e interditado pela censura
até 1987, que o estilo de Kieslowski começa de fato a florescer. Trata-se da narrativa complexa de três caminhos alternativos para a vida de um estudante de medicina, Witek (Boguslaw Linda).
O "nó de tempo", a encruzilhada de destinos possíveis, é a
chegada esbaforida do protagonista à plataforma de uma estação. Numa das alternativas, ele
alcança o trem para Varsóvia e
se torna um agente do partido
oficial do regime comunista.
Nas outras duas, Witek perde o
trem e embarca em vidas diferentes: ativista dissidente ou
médico apolítico.
Não há aqui o esquematismo
que se esperaria do mesmo tema nas mãos de um Ettore Scola. Os tempos alternativos não
são compartimentos estanques, e os papéis assumidos por
Witek não estão assim tão distantes um do outro.
Não é só no enredo engenhoso que se forja a densidade desse drama sobre os dilemas da
ética, do amor e da fé (política,
religiosa), mas sobretudo no
uso das cores (o violeta, o amarelo) na composição de um espaço dramático profundo e pulsante, cheio de desvãos onde os
seres podem se encontrar ou se
perder. O "expressionismo cromático" do "Decálogo" e da
"Trilogia das Cores" tem talvez
aqui a sua bela gênese.
ACASO/ CINEMANÍACO
Diretor: Krzysztof Kieslowski
Lançamento: VideoFilmes
Quanto: R$ 46 (cada um, em média)
Avaliação: ótimo/ bom
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