São Paulo, sexta-feira, 06 de outubro de 2006

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Crítica/"Do Luto à Luta"

Convenções da reportagem restringem força do filme

SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA

A naturalidade com que trata da síndrome de Down torna "Do Luto à Luta" um documentário de notável função social, ao descortinar um mundo ainda cercado de preconceito e desinformação. Essa tarefa é cumprida com relativa simplicidade. Em primeiro lugar, ouvem-se pais cujos filhos ingressaram na estatística (cerca de 8.000 bebês por ano nascem com esse problema genético no Brasil).
As histórias relatadas por eles assinalam, entre outros aspectos, o peso da responsabilidade que surge na própria maternidade. É o momento descrito por uma das mães como de "luto", em seguida substituído pela "luta" -o esforço de tratar com amor e oferecer oportunidades a alguém que a sociedade tenderá a segregar.
Aos poucos, entram em cena crianças, jovens e adultos "downianos". Eles falam sobre o que pensam, sentem e desejam, enquanto o filme os acompanha em plena inserção social -na escola, praticando esportes, trabalhando, namorando.
Dar voz (e imagem) a quem não costuma ser ouvido (e visto além do estereótipo) é também o procedimento-base de "À Margem da Imagem" e "À Margem do Concreto", documentários de Evaldo Mocarzel.
Um dos "downianos" pergunta ao diretor por que está fazendo o filme. A resposta possibilita que Mocarzel se revele personagem do cenário que registra, assumindo a condição de cineasta-participante, tão envolvido pelo assunto quanto seus entrevistados.
A informação tem um quê de intromissão, tardia e cercada de alguma artificialidade autoral. Configura opção bem distinta, por exemplo, do procedimento que levou Kiko Goifman a conceber "33" a partir da coincidência entre sujeito e objeto do documentário.
A naturalidade e a simplicidade de "Do Luto à Luta" trabalham pela difusão de uma boa causa, mas acabam também, ao optar por procedimentos narrativos que giram apenas em torno de recursos e convenções básicos da reportagem, por restringir a sua força.


DO LUTO À LUTA   
Direção: Evaldo Mocarzel
Produção: Brasil, 2005
Quando: em cartaz no Frei Caneca Unibanco Arteplex


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