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Cocurador da Bienal defende obras antigas na mostra
Sul-africano Sarat Maharaj afirma que avanço do mundo digital reacordou produção de Hélio Oiticica, Lygia Clark e Lygia Pape
FABIO CYPRIANO
DE SÃO PAULO
Afinal, qual o sentido em
se expor mais uma vez na 29ª
Bienal de São Paulo, voltada
à produção atual, trabalhos
de Hélio Oiticica e Lygia Pape, criados há mais de 40
anos?
"Arte não tem tempo. As
obras são criadas, dão seu recado e entram num estado de
dormência. Algumas vezes
elas são acordadas dessa hibernação", afirma Sarat Maharaj, um dos cinco cocuradores estrangeiros da mostra. "Há sempre um copo de
mar para o homem navegar."
Nascido na África do Sul,
mas desde 1976 radicado na
Inglaterra, onde deu aulas no
Goldsmith's College, centro
londrino formador de artistas
e curadores, Maharaj foi um
dos curadores da Documenta
11 de Kassel (Alemanha), em
2002, e atualmente é professor na Suécia. Sua atividade
acadêmica é tão concorrida
que costuma ter em sala de
aula arquitetos como Rem
Koolhas e curadores como
Hans-Ulrich Obrist.
O que tirou Hélio Oiticica,
Lygia Clark -que acabou
não entrando na Bienal por
divergências com a família-
e Lygia Pape da "hibernação" foi o avanço do mundo
digital, que Maharaj chama
de "pensamento algorítmico": "Eles produziram um tipo de arte que pode ser vista
como conceitual, mas não é
intelectualizada. Oiticica,
Clark e Pape criaram ideias
poderosas, que mesmo sendo analíticas, foram pensadas para produzir um conhecimento que se realiza no
corpo. Esse conhecimento
encorpado nos interessa na
era do que chamo conhecimento algorítmico", explica.
NOVA ESCRAVIDÃO
Para o pensador, a era digital teria criado uma falsa
sensação de emancipação.
"Alguns de nós trabalhamos
em casa, com um sentimento
de liberdade, mas no fim, estamos o tempo todo conectados, o trabalho se tornou profundamente internalizado e,
por isso, vivemos numa nova
forma de escravidão."
Por isso, então, fazem sentido novamente as experiências dos artistas brasileiros
nos anos 1960 e 1970. "A contribuição que estes artistas fizeram foi para a história da
arte e não apenas para a cena
brasileira. Eles nos deram
modos de pensamento, formas de produção de conhecimento por meio da arte, onde
o corpo é parte essencial dessa questão", conta.
Na Bienal, Maharaj aponta
o mexicano Antonio Vega
Macotela como um "herdeiro" desse pensamento.
"Macotela examina de forma microscópica elementos
de troca entre encarcerados e
o próprio artista. Ele realizou
coisas que os presos gostariam no mundo livre, ao passo que os presos cumpriram
tarefas como registrar seus
respiros ou colar as unhas
cortadas num suporte. Para
mim, essa é a quintessência
do tipo de pensamento brasileiro, que se realiza através
do corpo".
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