São Paulo, quarta-feira, 06 de outubro de 2010

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Cocurador da Bienal defende obras antigas na mostra

Sul-africano Sarat Maharaj afirma que avanço do mundo digital reacordou produção de Hélio Oiticica, Lygia Clark e Lygia Pape

FABIO CYPRIANO
DE SÃO PAULO

Afinal, qual o sentido em se expor mais uma vez na 29ª Bienal de São Paulo, voltada à produção atual, trabalhos de Hélio Oiticica e Lygia Pape, criados há mais de 40 anos?
"Arte não tem tempo. As obras são criadas, dão seu recado e entram num estado de dormência. Algumas vezes elas são acordadas dessa hibernação", afirma Sarat Maharaj, um dos cinco cocuradores estrangeiros da mostra. "Há sempre um copo de mar para o homem navegar."
Nascido na África do Sul, mas desde 1976 radicado na Inglaterra, onde deu aulas no Goldsmith's College, centro londrino formador de artistas e curadores, Maharaj foi um dos curadores da Documenta 11 de Kassel (Alemanha), em 2002, e atualmente é professor na Suécia. Sua atividade acadêmica é tão concorrida que costuma ter em sala de aula arquitetos como Rem Koolhas e curadores como Hans-Ulrich Obrist.
O que tirou Hélio Oiticica, Lygia Clark -que acabou não entrando na Bienal por divergências com a família- e Lygia Pape da "hibernação" foi o avanço do mundo digital, que Maharaj chama de "pensamento algorítmico": "Eles produziram um tipo de arte que pode ser vista como conceitual, mas não é intelectualizada. Oiticica, Clark e Pape criaram ideias poderosas, que mesmo sendo analíticas, foram pensadas para produzir um conhecimento que se realiza no corpo. Esse conhecimento encorpado nos interessa na era do que chamo conhecimento algorítmico", explica.

NOVA ESCRAVIDÃO
Para o pensador, a era digital teria criado uma falsa sensação de emancipação. "Alguns de nós trabalhamos em casa, com um sentimento de liberdade, mas no fim, estamos o tempo todo conectados, o trabalho se tornou profundamente internalizado e, por isso, vivemos numa nova forma de escravidão."
Por isso, então, fazem sentido novamente as experiências dos artistas brasileiros nos anos 1960 e 1970. "A contribuição que estes artistas fizeram foi para a história da arte e não apenas para a cena brasileira. Eles nos deram modos de pensamento, formas de produção de conhecimento por meio da arte, onde o corpo é parte essencial dessa questão", conta.
Na Bienal, Maharaj aponta o mexicano Antonio Vega Macotela como um "herdeiro" desse pensamento.
"Macotela examina de forma microscópica elementos de troca entre encarcerados e o próprio artista. Ele realizou coisas que os presos gostariam no mundo livre, ao passo que os presos cumpriram tarefas como registrar seus respiros ou colar as unhas cortadas num suporte. Para mim, essa é a quintessência do tipo de pensamento brasileiro, que se realiza através do corpo".


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