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ANÁLISE
Lombardi foi prisioneiro do mito
TONY GOES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Certa vez alguns executivos
do SBT tiveram uma ideia engraçada: propor à revista "Caras" uma matéria com o Lombardi, mostrando em detalhes a
casa e a família do locutor mais
famoso do Brasil.
Só uma coisa ficaria de fora: o
rosto do locutor. Boa-praça como sempre, Lombardi topou
na hora. Mas o projeto não foi
adiante, porque esbarrou no
veto de Silvio Santos. O apresentador fazia questão absoluta de manter a aura de mistério
em torno do dono da voz que se
confundia com a própria identidade de sua emissora.
Nos últimos anos essa proibição foi se abrandando. Apesar de jamais aparecer no vídeo, a cara de Lombardi não era
mais tabu. Bastava uma "googlada" ou uma fuçada no YouTube e lá estava ele: um senhor
de aparência comum, quase
sempre de óculos escuros.
O locutor chegou a dar uma
entrevista para um repórter da
megarrival Globo na concentração da escola de samba Tradição, que em 2001 desfilou
com um enredo em homenagem a Silvio Santos. Mesmo assim, o segredo continuava
-ainda que em tom de brincadeira, com direito a comunidades no Orkut do tipo "Quem é o
Lombardi?".
Quase uma estrela
Ele era realmente único. Voz
e nome conhecidíssimos do
Oiapoque ao Chuí, imitadíssimo por profissionais e amadores, a escada perfeita para a
exuberância de Sílvio. Desde a
era de ouro do rádio, nunca
ninguém ficou tão célebre sem
ter um rosto conhecido pelo
público. Qualquer canal de TV
tem seus locutores oficiais, que
dão voz a chamadas e aberturas
de programas. Mas são todos
sempre anônimos, e nenhum
pode se considerar uma estrela.
Lombardi era quase uma estrela. Instantaneamente reconhecível como um símbolo do
SBT, ele não recebia da emissora um tratamento à altura. Seu
salário era uma fração do que
recebem os grandes nomes da
casa. O homem virou vítima do
personagem: seu campo de trabalho era limitado, porque estava por demais associado a um
canal de TV. Pela mesma razão,
não recebia propostas para mudar de emprego. Foi ficando, ficando, ganhando pouco e sem
maiores perspectivas, prisioneiro de um mito construído ao
longo de 35 anos.
Dificilmente haverá outro
Lombardi. Seu estilo empostado está fora de moda, e os próprios programas de auditório
parecem caminhar para a extinção. Mas vai deixar saudade,
porque faz parte da memória
afetiva de várias gerações de
brasileiros. Afinal, quantos locutores podem se gabar de estarem sempre associados a momentos de alegria?
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