São Paulo, sábado, 07 de fevereiro de 2009

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LIVROS

Pesquisa analisa toda a obra infantil de Lobato

Volume reúne 28 ensaios acadêmicos sobre o autor de "Reinações de Narizinho"

Segundo organizadores, trabalho expõe "um Lobato irreverente, criativo e político" e inclui estudos até mesmo de livros marginais

GABRIELA ROMEU
DA REPORTAGEM LOCAL

O ponto final de "A Menina do Narizinho Arrebitado", de 1920, foi só o início da constante reescritura da saga do criador do Sítio do Picapau Amarelo, Monteiro Lobato (1882-1948), que anunciava garimpar "palavras singelas", num estilo cristalino como "água de pote", para escrever em "língua desliteraturizada" para crianças. É o que destaca "Monteiro Lobato Livro a Livro - Obra Infantil", que reúne 28 estudos de pesquisadores de várias instituições brasileiras, que esmiuçam uma espécie de oficina do processo de criação do autor. Com a coorganização de Marisa Lajolo e João Luís Ceccantini, os textos trazem à tona a análise de quase 2.000 documentos (cartas, fotos, contratos, edições) depositados pelos herdeiros na Unicamp -parte está em www.unicamp.br/iel/monteirolobato.
Professor de literatura brasileira da Unesp-Assis, Ceccantini conta que há muitos livros panorâmicos sobre a obra lobatiana. "Mas algumas publicações eram sempre citadas, enquanto outras, ignoradas." Entre as da boa safra sempre deixadas de lado no passado, estão "O Picapau Amarelo" e "A Chave do Tamanho". São analisados inclusive os livros marginais, como "O Garimpeiro do Rio das Garças" (1924), sobre as aventuras de João Nariz. A imagem na obra lobatiana, a marca do caricaturista Belmonte e a vertente do Lobato editor também recebem atenção especial. "O livro mostra um Lobato irreverente, criativo e político, mas traz como tudo isso se reflete nas diferentes edições de uma mesma história", diz Lajolo, professora de literatura brasileira da Unicamp e da Universidade Mackenzie. Ceccantini destaca a faceta "de um artífice da palavra, que reescreve seu texto o tempo todo e vê a literatura como algo nada mumificado".
O texto emblemático dessa reescritura é "Reinações de Narizinho", obra em transformação desde o seu surgimento, em 1920. Até 1931, principalmente, ganhou capítulos, recebeu outros títulos e perdeu trechos -na primeira versão, por exemplo, foram suprimidas passagens que remetiam as aventuras a um sonho, muleta clássica da ficção infantil.

Geração da TV
O hábito do escritor em trocar cartas com os leitores também perpassa os capítulos. Em alguns trechos, as crianças comentam as reinações, marcadas pelo sotaque da oralidade. "Isso documenta a recepção de Lobato na época", diz Lajolo. Já a recepção infantil da obra lobatiana hoje é escassa em estudos. "Tenho feito pesquisas, com professores e crianças, propondo leituras dos livros", diz Ceccantini. "E parece que as crianças não leem Lobato porque os seus mediadores pais e professores também não o leram, geralmente eles conhecem as histórias da TV."
E existe algum jeito de a criança mergulhar no texto original desse "universo paralelo" hoje? "Talvez seja o caso de dessacralizar a obra, assim como Lobato fazia, ler de outra forma, com mais liberdade, pulando trechos, deixando a criança fazer seu próprio caminho", sugere.


MONTEIRO LOBATO LIVRO A LIVRO - OBRA INFANTIL
Organizadores: Marisa Lajolo e João Luís Ceccantini
Editora: Unesp
Quanto: R$ 62 (512 págs.)



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