São Paulo, quinta-feira, 07 de março de 2002

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"A TEORIA DA REVOLUÇÃO NO JOVEM MARX"

Löwy descreve a trajetória indivisível de Karl Marx

GILBERTO FELISBERTO VASCONCELLOS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Foi há pouco tempo modismo intelectual parisiense, espalhado por vários cantos do mundo, inclusive aqui em nossa praia, o bisturi epistemológico que cindia o jovem Marx do velho, dando ensejo às sutilezas mirabolantes acerca de um Marx meia idade, coroa, avoengo.
Na verdade, o que existe é um só Karl Marx, indiviso, inconsútil, inteiriço, conforme revela o marxista Michael Löwy, em cujo livro o leitor encontrará o percurso ideológico mais importante do século 19: como e porque o indivíduo Marx virou comunista e crítico radical do princípio e da existência da propriedade privada.
Discípulo de Lucien Goldman, Michael Löwy nos informa a primeira vez que o autor do "Manifesto do Partido Comunista" usou a palavra "proletariado".
Jornalista, Marx começou falando dos pobres e da floresta da Alemanha. Foi a questão energética da madeira que o levou do pobre ao proleta.
Uni-vos! A natureza. O trabalho. A solidariedade. A relação entre os despossuídos e os libertários. A classe social. A profissão. Não conseguiu ser professor universitário. Falha da democracia, as portas da universidade se lhe fecharam.
Desde cedo preocupado com a importância do pensamento, escreveu na "Gazeta Renana": "Os filósofos não brotam da terra como os cogumelos. Toda filosofia é a quintessência espiritual de seu tempo."
Ao mesmo tempo que valorizava a filosofia, sacaneava o filósofo chato e pedante que se compraz em interpretar o mundo, e não em transformá-lo.
Vivendo no fastígio do carvão mineral, impressiona como Marx anteviu no roubo da floresta a definição de propriedade.
Proudhon foi seu amigo. O coração da propriedade privada está conectado à inexistência de burguesia arrependida.
Não menos complicada é a situação da classe operária, condenada a ser revolucionária ou não ser nada. Por isso que a missão do proletariado é o assunto do século 20 que ressoa até em Oswald de Andrade: aqui, o boêmio é o contrário do burguês, e não o proleta.
Todavia, mesmo a contradição universal entre burguesia e proletariado é embaraçosa, porque a miséria social não se traduz necessariamente em razão política.
E mais: golpe é sempre coisa de direita. Quanto ao intelectual, o que importa é menos a classe social a que pertence do que a classe social por ele representada com suas idéias. Afinal, Marx e Engels não eram operários. Nem Trotsky. Nem Georg Lukàcs.
Michael Löwy se insurge diante da distinção entre o Marx, homem de ciência de homem de ação. Assim, o Marx bom é aquele que analisa cientificamente o funcionamento do sistema capitalista, enquanto o Marx ruim é o ideólogo da revolução socialista.
É essa distinção que explica a presença de "marxistas" e "ex-marxistas" instalados no aparelho neoliberal do poder em vários países do mundo, inclusive no Brasil dos últimos oito anos.


Gilberto Felisberto Vasconcellos é professor de ciências sociais da Universidade Federal de Juiz de Fora e autor, entre outros, de "Glauber Pátria Rocha Livre" (Senac)


A Teoria da Revolução no Jovem Marx     
Autor: Michael Löwy
Editora: Vozes
Quanto: R$ 25 (245 págs.)




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