São Paulo, sábado, 07 de março de 2009

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Artistas interpretam catástrofes climáticas

Mostra na Oca reúne fotos e vídeos com visões apocalípticas do futuro do planeta

Com curadoria de Alfons Hug, exposição serve de prévia para a Bienal do Fim do Mundo, que começa em abril, na Terra do Fogo (Argentina)

SILAS MARTÍ
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma torre de dez toneladas de gelo começa a derreter hoje na Oca. A intervenção na coletiva "Intempéries", com obras de 30 artistas, deve transformar o subsolo do prédio no Ibirapuera num espelho d'água -e rápido, se o calor que vem sufocando São Paulo não se dissipar. Os termômetros em ebulição na cidade e as nevascas que têm paralisado o hemisfério norte servem, aliás, de prelúdio irônico, senão trágico, à mostra que tenta lançar um olhar artístico aos fenômenos climáticos -é uma prévia da Bienal do Fim do Mundo, que começa em abril, na gélida Terra do Fogo, ponto no extremo sul da Argentina.
Enquanto na agora escaldante São Paulo, o subsolo da Oca vai virando piscina, também ganham vulto as ondas na baía de Guanabara, retratada por Thiago Rocha Pitta. No vídeo, as ondas azuis abraçam um bote reluzente à distância, e a luz do sol vira escuridão repentina. "Cada vez mais me convenço de que gosto do sobrenatural", afirma Rocha Pitta, 28. "Mas minha pegada é mais poética do que qualquer denúncia."
Essa ambivalência marca os trabalhos na mostra, que hesitam entre se assumir como obra panfletária, arriscando semelhanças com documentários do Discovery, cheios de letárgicas geleiras se despedaçando, e focar em aspectos formais, revestindo de um verniz estetizante as tais intempéries. Em Rocha Pitta, o verniz vem da literatura: um conto de Joseph Conrad sobre a primeira noite de um capitão num navio. Na mesma pegada náutica, o britânico Simon Faithfull registra o que restou da estação baleeira de South Georgia, na costa antártica. Antes um entreposto comercial que abastecia a Europa com óleo de baleia, combustível usado até na iluminação pública de Londres, a ilha foi tomada por milhares de focas, que ocupam as fábricas.
"É uma visão do mundo depois que não estivermos mais aqui", descreve Faithfull, 42. "É o lugar mais estranho que já vi na vida, cheio de animais e o barulho ensurdecedor deles." Longe do ruído, o alemão Michael Sailstorfer sugere outra visão apocalíptica. Uma pequena casa de campo é destruída, com suas portas, janelas e paredes queimadas na própria lareira, até não sobrar nada, só a fumaça preta no céu -imagem que lembra as nuvens metafísicas de Giorgio De Chirico- e pilhas de cinzas no chão. "Tem a ver com vida e morte, o uso total dos recursos e do tempo", diz Sailstorfer, 30. "É metafórico e sarcástico."
Também corrosivo, o vídeo de Reynold Reynolds mostra os moradores de uma casa em chamas, que parecem não se importar muito com as labaredas que consomem móveis e roupas. De quebra, o coreano Shin Kiwoun tritura um relógio, numa contagem dos segundos que restam antes do fim.


INTEMPÉRIES
Quando: abertura hoje, às 11h; de ter. a sex., das 14h às 20h, sáb. e dom., das 10h às 20h; até 12/4
Onde: Oca (pq. Ibirapuera, portão 3, tel. 0/xx/11/3081-0113); livre
Quanto: entrada franca



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